Iniciativas que tornam o mundo mais verde

O Globo, Sociedade, p. 28 - 20/11/2014
Iniciativas que tornam o mundo mais verde
Modelos de gestão pioneiros proporcionam criação de parques em favelas e mistura de ecossistemas
"Além da transformação da área do parque, também mudamos a comunidade" Mauro Quintanilla
Presidente do Parque Sitiê

RENATO GRANDELLE
renato.grandelle@oglobo.com.br

Do entulho a uma horta, da torre abandonada a um espaço que mistura o clima de todas as estações do ano. Com projetos desenhados e um bocado de ambição, gestores constroem parques nos locais mais insólitos. As atrações turbinam a economia local, ao mesmo tempo em que proporcionam a seus vizinhos um novo espaço para lazer.
Nascido há 54 anos no Morro do Vidigal, na Zona Sul do Rio, Mauro Quintanilla sempre se incomodou com o entulho que forrava o topo da favela. Sem respostas da Comlurb ou da Associação de Moradores, Quintanilla e seu vizinho, Paulo de Almeida, assumiram as vassouras. Recolheram 16 toneladas de entulho, com a ajuda descompromissada de amigos e turistas.
- Encontramos tudo, de geladeiras a carniça de cachorro - lembra Quintanilla. - Removemos muita coisa, mas, à noite, as pessoas jogavam mais lixo. Este costume só acabou quando começamos a colher frutas e verduras e distribuímos entre os moradores. Além da transformação da área do parque, também mudamos a comunidade.
As mudas, uma cortesia do Jardim Botânico, também abasteceram o sonho de Quintanilla de aprender paisagismo. Os pneus rejeitados pelo morro serviram para erguer uma barreira de contenção. O jardim do Vidigal levou turistas a encararem a escadaria. Um dos visitantes gostou tanto do parque, batizado Sitiê, que trocou a casa no asfalto por uma na comunidade. Mestre em políticas públicas pela Universidade de Harvard, Pedro Cristo elaborou projetos orçamentários e de gestão para o espaço de 8,5 mil m². Seus planos, no entanto, vão muito além desta área.
- Mapeamos as minas naturais do Morro Três Irmãos e, agora, queremos fazer um sistema de coleta e distribuição da água, que irá para o Itiê e todo o Vidigal - revela Cristo, diretor fundador do parque, presidido por Quintanilla. - Também pensamos em parcerias com a iniciativa privada. É necessário atacar alguns problemas que são vistos em todas as favelas, como facilitar o acesso e o reduzir o risco de erosão.
Uma inspiração do novo espaço carioca pode estar a 1,5 mil quilômetros dali. O Parque Nacional do Iguaçu é um dos quatro geridos pelo governo federal com estrutura adequada para o turista. Suas atrações sustentam a economia da cidade de 256 mil habitantes.
- Recebemos 1,5 milhão de visitantes por ano - conta Bruno Marques de Oliveira, diretor-presidente da concessionária Cataratas do Iguaçu S.A., empresa que administra o parque. - No Brasil, cada emprego direto no turismo gera 11 indiretos. É uma indústria muito pouco explorada, mas que atrai a comunidade.
De acordo com Marques, o crescimento do setor é freado pela resistência às concessões privadas, ainda "vistas com desconfiança" pelo governo.
- O modelo de gestão brasileiro é muito incipiente, comparado ao americano, que definiu a administração dos parques há um século - revela. - Quando contabilizamos a economia produzida pelo turismo, não temos ideia do que ele proporciona para outros setores de uma cidade.
A resistência americana a novos modelos de gestão de parques é menor, mas volta e meia ela se manifesta. O Brooklyn Bridge Park, no bairro americano do Brooklyn, é um exemplo.
Antiga zona portuária, a região de 340 mil m ² foi abandonada conforme os contêineres exigiam cada vez mais espaço. A prefeitura cogitou liberar o uso residencial da área, mas seus vizinhos, em vez de prédios, exigiram um parque.
- A prefeitura cedeu à pressão popular em 2008, mas temia os gastos com a manutenção daquela área - revela Regina Myer, presidente da empresa Brooklyn Bridge Park Corporation, responsável pela operação do local. - Nossa resposta foi inovadora. Temos a contribuição financeira do setor hoteleiro, e parte dos impostos municipais da vizinhança é remetida para a administração do parque.
Hoje, o parque nova-iorquino recebe 100 mil visitantes a cada fim de semana. O cinema ao ar livre, com vista para a Estátua da Liberdade, atrai turistas e moradores locais.
- Nos últimos 20 anos, com a política de segurança de Nova York, o Brooklyn tornou-se uma área vibrante - comemora Regina. - Nova York tem mais de 8 milhões de habitantes e é destino de mais de 40 milhões de turistas por ano. A cidade pode receber mais do que o Central Park, em Manhattan. Ironicamente, uma de nossas atrações é a vista para aquela região.
MISTURA DE ECOSSISTEMAS EM MOSCOU
Enquanto o Brooklyn aproveita sua nova área verde, Moscou vê na prancheta um projeto que mudaria a cara do centro da cidade. O Parque Zaryadye promete unir a natureza da Rússia em 300 mil m².
O escritório americano Diller Scofidio+Renfro idealizou o espaço, que reproduzirá, nas margens do Rio Moskva, quatro típicos ecossistemas do país - tundra, estepe, floresta e pântano. Para equilibrar o meio ambiente, recorrerá a artifícios como regulação da temperatura, controle de ventos e simulação de luz natural, entre outras parafernálias. Estima-se que a construção do Zaryadye vai durar dois anos e começará até janeiro de 2015.
- Observamos que, em Moscou, as áreas verdes são muito separadas: há espaços com árvores, outros para as pessoas - avalia Brian Tabolt, arquiteto e designer que está à frente do projeto no parque. - O Zaryadye teria maior fluidez. Os visitantes passearão por colinas artificiais, cujo topo será quente o ano inteiro, e cavernas que armazenarão o frio do inverno. A mistura de ecossistemas tornaria este parque um símbolo de toda a Rússia, e não apenas de Moscou. É uma gestão sem precedentes no mundo.

O Globo, 20/11/2014, Sociedade, p. 28

http://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/gestao-inovadora-cria-parques-em-favelas-iniciativas-que-misturam-ecossistemas-14609766
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