Longe da água

O ECO - www.oeco.com.br - 28/01/2010
Pesquisa encabeçada por brasileiros e publicada este mês na revista Conservation Biology mostra que a fragmentação de florestas é especialmente ameaçadora a sapos da Mata Atlântica, região rica em anfíbios endêmicos, ou seja, que só existem ali. Os animais são úteis ao próprio homem e ao equilíbrio ecológico que mantém a saúde das matas.

Durante o estudo, foram analisados os hábitos de quatro espécies de sapos em áreas entre as serras da Mantiqueira e do Mar, no estado de São Paulo. Assim, foi possível comprovar que ao afastar rios e córregos das florestas, o desmatamento se torna uma poderosa ameaça a anfíbios que dependem da água para reproduzir e se desenvolver. Afinal, a grande maioria das centenas de espécies brasileiras põe ovos na água que eclodem e se transformam em larvas, que evoluem para girinos e só depois atingem a fase adulta. Pequena parcela põe ovos na folhagem, de onde nascem pequenos sapos prontos para ganhar a natureza.

Esse tipo particular de fragmentação, que cria uma faixa desmatada entre o rio e a floresta, para outros animais como aves e mamíferos de maior porte, não é tão relevante, mas para anfíbios que nascem nos rios e córregos e passam a vida na mata, é crucial. "Num ambiente natural conservado, floresta e rio estão juntos. Mas com a degradação das matas ciliares, o caminho se torna longo e ameaçador aqueles que nascem e precisam deixar a água em busca da floresta, e também aqueles que precisam voltar à água para se reproduzir", explicou um dos autores do artigo, Carlos Sorensen da Fonseca, do departamento de Botânica, Ecologia e Zoologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

As perigosas migrações impostas a sapos e pererecas também os expõem a predadores e se somam a outras ameaças, como a própria perda de moradas para o desflorestamento, doenças, poluição do ar e da água e mudanças do clima.

Apenas nas áreas protegidas

Na região de São Luís do Paraitinga, onde a pesquisa foi conduzida, a destruição das matas para abertura de pastagens e cultivo de eucalipto extinguiu praticamente todos os anfíbios. Amostras da fauna original só podem ser encontradas em áreas protegidas como o parque estadual da Serra do Mar, ou na reserva biológica federal do Tinguá, com apenas 25 hectares, já em Foz do Iguaçu (RJ). "Fora de unidades de conservação, quase todos os anfíbios desapareceram na região. Os quatro que estudamos são praticamente os últimos que sobraram", comentou Fonseca.

Para o doutor em Ecologia pela Universidade de Oxford (Reino Unido), o estudo traz uma mensagem clara de que é preciso proteger e recuperar a vegetação nas margens de rios e córregos. "A legislação diz que pequenos riachos devem ter trinta metros de florestas a partir de cada margem, mas infelizmente em São Paulo e outros estados isso é raramente respeitado", ressaltou. "Poderíamos ter programas estaduais e municipais para recuperação das matas ciliares e para conecção entre fragmentos florestais isolados", disse.

Atitudes como essa beneficiariam não só os anfíbios, mas várias outras espécies e a própria sociedade. Afinal, sapos e pererecas controlam populações de mosquitos e outros insetos, que costumam adentrar nossas casas, e também são comidos por animais de maior porte, ajudando a equilibrar a cadeia alimentar nas florestas. E matas preservadas mantêm água em quantidade e qualidade para abastecimento humano, entre outros serviços gratuitos. "Todos são argumentos válidos para a conservação e recuperação de nossas matas. Além da manutenção da água, contêm erosões e enchentes e defendem a biodiversidade brasileira", comentou Fonseca.

O Brasil tem mais de 800 espécies de anfíbios, é o país mais rico do globo nesse tipo de animal. Cerca de trezentas espécies só existem na Mata Atlântica, cujas florestas originais estão reduzidas a menos de 10% do que eram no passado.

O artigo Habitat Split as a Cause of Local Population Declines of Amphibians with Aquatic Larvae também é assinado pelos pesquisadores Carlos Guilherme Becker (Cornell University, Estados Unidos), Célio Haddad (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho) e Paulo Prado (Universidade de São Paulo).
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