Cercado de invasores por todos os lados

O Globo, Rio, p.20 - 11/07/2004
Cercado de invasores por todos os lados
Multiplicação de casas, condomínios e pousadas no meio da mata ameaça o Parque Nacional de Itatiaia
A ocupação desordenada de áreas turísticas como Penedo, Serrinha do Alambari, Maringá e Visconde de Mauá, que resulta em desmatamentos, queimadas e poluição de mananciais é hoje a principal preocupação da direção do Parque Nacional de Itatiaia, no Sul Fluminense. Aos poucos, as construções começam a se aproximar e invadir o entorno do parque, uma reserva de Mata Atlântica de 30 mil hectares na divisa de Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Para tentar conscientizar a população dos municípios que fazem limite com a mata, a diretoria do parque tem promovido programas de educação ambiental e buscado parcerias. Mas nem sempre consegue a adesão de moradores e empreendedores.
De acordo com dados da Delegacia da Polícia Federal em Nova Iguaçu — que até o mês passado cuidava dos casos da região de Resende e Itatiaia — existem atualmente mais de 200 inquéritos sobre problemas ambientais na região do Parque Nacional de Itatiaia. A maioria por conta das invasões — normalmente promovidas por pessoas de alto poder aquisitivo — da área de preservação ambiental.
Oito funcionários para fiscalizar toda a região
A segunda maior preocupação da administração do parque, no Estado do Rio, é a extração ilegal do palmito juçara — base da cadeia alimentar de vários animais da Mata Atlântica. Em Minas, o problema é a expansão das fazendas.
— Vivemos constantemente sob a ameaça de impactos ambientais. Principalmente nas áreas de entorno do parque, ou seja, no perímetro de dez quilômetros de mata entre a área urbana e a floresta. Cerca de 80% dos autos de infração aplicados são por conta de alterações em área de preservação permanente. No Estado do Rio, isso acontece basicamente nas áreas de grande apelo turístico, onde vem crescendo rapidamente o número de casas, condomínios, hotéis e pousadas — diz o chefe do parque, o biólogo Henrique Zaluar, que tem apenas de oito funcionários para fiscalizar toda a região.
O fato de a área do parque estar entre dois municípios fluminenses — Resende e Itatiaia — e três mineiros — Itamonte, Alagoa e Bocaina de Minas — e de conter em seu território áreas de preservação ambiental (APA) e de preservação permanente (APP), algumas geridas pelo estado ou pelos municípios, acaba resultando em mais uma complicação. Como as leis se sobrepõem fica difícil decidir quem tem direito a construir ou não naquela região. É preciso uma série de licenças de órgãos diversos.
— Nem todos cumprem ou seguem a legislação. Além do mais, só muito recentemente passou-se a ter uma preocupação com o meio ambiente. Agora as regras são mais rígidas. O que há 30 ou 40 anos era permitido, hoje é crime ambiental. É complicado fazer as pessoas entenderem isso. Todo mundo busca qualidade de vida e quer construir no meio da mata — explicou Zaluar, que estará promovendo no próxima sexta-feira o 1o Ecoartes (evento com artistas da região das Agulhas Negras) na sede do parque e em setembro vai promover um seminário itinerante sobre preservação pelos municípios vizinhos. — Vamos orientar os moradores sobre queimadas, invasões e mostrar a importância de preservação da Mata Atlântica.
Para o responsável técnico e analista ambiental do parque Luiz Sérgio Sarahyba, as áreas mais críticas são Penedo e Visconde de Mauá, onde as construções estão avançando rápida e perigosamente em direção aos limites da reserva. Em Penedo, as construções que antes se limitavam a um vilarejo já estão subindo as encostas, abrindo servidões e desmatando trechos no alto dos morros. Recentemente, uma obra foi embargada no centro urbano. A construção não respeitava a distância de 30 metros entre o curso d’água e a área construída.
Em Mauá, o maior problema reside no Lote 10, bairro carente, cujas casas foram erguidas dentro de uma APP.
— Ao contrário do Parque Nacional da Tijuca, que sofre com a favelização, em Itatiaia nosso maior problema é a ameaça que representa o crescimento desordenado de regiões turísticas — ressaltou Sarahyba. — As autoridades devem ter cuidado redobrado ao permitir qualquer edificação em área de reserva.
Sauna estava sendo construída à beira de rio
Com tão poucos fiscais, a diretoria do parque conta com o apoio de moradores, ONGs, ecologistas e denúncias para contar o avanço irregular sobre as áreas protegidas. Na Serrinha do Alambari, em meio à APA, não é difícil encontrar placas anunciando a venda de terrenos no meio da mata fechada. Segundo Sarahyba, a venda é permitida. A construção, nem sempre.
Há obras que, mesmo autorizadas, ainda são controversas. É o caso do condomínio Chalé Club Alambari, vizinho à Mata Atlântica. A obra está em andamento desde 1995. O proprietário, o ex-secretário de Comércio e Indústria de Resende Eliel de Assis Queiroz, obteve todas as licenças — inclusive do Conselho Gestor de Meio Ambiente — para construir 30 chalés na APA Serrinha do Alambari. Mesmo assim, não escapou de denúncias e fiscalizações.
— O projeto apresentado em 95 foi aprovado. Meu terreno é o penúltimo da região que tem permissão para a construção. Mesmo assim, a área construída representa apenas 5% do terreno de 240 mil metros quadrados. Segundo o Ibama, 20% do terreno devem ser destinados à reserva. Deixei 95% para a mata— garante Queiroz.
Com leis mais rigorosas, não são raras as construções e ampliações que costumam ser embargadas pelo Ibama. São casas em platôs com vasta área desmatada, picadas e caminhos na mata por dentro de propriedades particulares que dão acesso a cachoeiras. Há quatro anos, o técnico ambiental Paulo Manoel dos Santos embargou a construção de uma sauna à beira do rio que corta Maringá.
— A casa foi construída há mais de 30 anos, quando a lei permitia. Hoje, isso não é mais possível, e a obra foi embargada.
Segundo Zaluar, a melhor opção para se evitar a destruição da reserva ainda é cooperação das comunidades. Principalmente, dos 250 imóveis instalados dentro do parque desde antes de sua criação, em 1937. São residências, hotéis, pousadas, restaurantes e armazéns.
— O ideal seria que não existissem moradias dentro do parque. Mas, já que elas existem, procuramos cooptar os moradores para o trabalho de preservação do parque — diz Zaluar.
A Diretoria de Ecossistemas do Ibama informou que a regularização dos imóveis dentro dos parques nacionais é uma de suas prioridades. No entanto, o processo é lento, pois é preciso saber quem é realmente o dono da terra para indenizá-lo. O problema é comum a outros parques.

Santuário sempre aberto

Criado em 1937, o Parque Nacional de Itatiaia fica numa área de 30 mil hectares, entre os estados de Rio de Janeiro e Minas Gerais, fazendo divisa com São Paulo. No Sul Fluminense, ele se divide entre as cidades de Resende e Itatiaia. Segundo a Diretoria de Ecossistemas do Ibama, o parque apresenta boas condições de preservação e equipamentos — hotéis, pousadas, museus, departamentos para estudos científicos — adequados. É um dos parques que mais recebem recursos do Ibama.
Entre as unidades fluminenses, o Parque Nacional de Itatiaia é um dos que apresentam melhores condições de conservação. Fica aberto à visitação todos os dias, sendo que o centro de visitantes não funciona às segundas-feiras. Entre as principais atrações estão o Pico das Agulhas Negras, o Museu da Flora e Fauna, o Lago Azul e a Cachoeira Véu da Noiva. A circulação pode ser feita a pé, em caminhos, trilhas e picadas que possibilitam o acesso a vários pontos.
O melhor mês para visitação é janeiro, quando se registram temperaturas mais altas. O parque também é muito procurado no inverno, quando os termômetros marcam entre 15 e cinco graus.
O acesso é feito pela Via Dutra (BR-116). No Km 318, sentido São Paulo, basta pegar, à direita, a estrada para o parque. O portão fica a cinco quilômetros da Via Dutra. O ingresso custa R$ 3 por pessoa e R$ 5 por veículo.



O Globo, 11/07/2004, p. 20
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