Favelas avançam pela floresta em Petrópolis

O Globo, Rio, p. 20 - 18/12/2005
Favelas avançam pela floresta em Petrópolis
Destruição de reservas de Mata Atlântica é tanta que o bairro Independência tem uma cachoeira de esgoto

Uma das principais áreas remanescentes de Mata Atlântica no estado está sendo ameaçada pelo crescimento de favelas. A constatação é do presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa, deputado Carlos Minc (PT), que sobrevoou a Região Serrana semana passada, com o diretor-executivo do Ibama no Rio, Rogério Rocco. A situação é mais grave, segundo o deputado, na Serra da Estrela, em Petrópolis, que forma um corredor florestal unindo a Reserva do Tinguá e o Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Com boa parte dos recursos oriundos do turismo, os municípios da região podem sofrer também impacto econômico devido ao problema.
Casas de classe média ocupam margens de rio
A Serra da Estrela integra a Área de Proteção Ambiental (APA) de Petrópolis (unidade federal). No sobrevôo, o deputado observou o crescimento de quatro comunidades. O que mais chamou a atenção no local foram os deslizamentos causados pelo acúmulo de lixo e uma cachoeira de água escura no bairro Independência.
- É a primeira cachoeira de esgoto que vejo - disse Minc. - A função do corredor florestal é evitar que a mata fique separada em ilhotas. A expansão dessas comunidades é uma ameaça séria. Em todo o estado, só restam 12% da Mata Atlântica, a maior parte localizada na Região Serrana.
Também foi constatado o crescimento de favelas e do número de casas de classe média nas margens do Rio Piabanha. A maior parte está localizada entre o distrito de Pedro do Rio e o município de Areal, mas também há construções ilegais no distrito de Itaipava. Parecer do Instituto Estadual de Florestas (IEF) também aponta o crescimento da Favela Mata-Cavalo dentro da APA de Petrópolis e nos arredores da Reserva Biológica de Araras (unidade estadual).
A favelização no município não foi detectada pelo IBGE no último censo. Em 2000, o instituto calculava existir só uma favela com 820 moradores. Em 1991, eram duas, com 693 pessoas. A explicação, segundo o secretário de Planejamento de Petrópolis, Eduardo Ascoli, reside no fato de não existirem comunidades inteiramente irregulares ou ocupando lugares de risco, mas sim construções isoladas. Ele calcula haver hoje 2.500 domicílios em áreas de preservação ou de risco.
- Petrópolis tem 85% do seu território como área de preservação ambiental e sua topografia naturalmente leva à ocupação das encostas. A prefeitura, sozinha, não tem recursos suficientes para cobrir esse déficit de moradias - justificou.
O Instituto Civis, ONG que atua na preservação ambiental e do patrimônio histórico de Petrópolis, relaciona o aumento da favelização ao enfraquecimento econômico do município. Em 1991, Petrópolis tinha a nona economia do estado. Em 2000, já havia caído para a 13ª posição. O período coincide com o da proliferação das favelas.
- Houve o empobrecimento da população e o aumento do desemprego. O pior é que essa situação perdura. Pesquisa da Firjan mostrou que este ano a oferta de empregos diminuiu 45% em relação a 2004 - afirmou o vice-presidente do instituto, Marcos Nóbrega. - A partir do momento em que a cidade começa a se igualar a outras do estado, repleta de favelas, perde seu atrativo turístico, o que prejudica ainda mais a economia.
Em quatro anos, 180 construções ilegais demolidas
O volume de investimentos da prefeitura e do governo estadual, apesar de estar crescendo, é insuficiente para mudar o quadro. Desde 2001, foram construídas no município 400 casas populares ou unidades multifamiliares, totalizando R$5,5 milhões. O número é mais de quatro vezes superior ao total entregue na década de 90. Outras 108 casas estão sendo construídas no bairro Carangola.
Segundo a prefeitura, nos últimos quatro anos foram demolidas 180 construções ilegais, incluindo algumas localizadas às margens da BR-040.

Na BR-040, margens ocupadas por barracos
Perto de Petrópolis, mas em território de Caxias, comunidade não recebe atenção de ninguém
Às margens da BR-040, uma comunidade formada principalmente por catadores de lixo sobrevive há 14 anos esquecida pelas autoridades. Sem qualquer infra-estrutura, nem mesmo energia elétrica, a pequena favela, chamada pelos moradores de Deus Proverá, fica numa área do município de Duque de Caxias encravada no alto da serra, a menos de 500 metros da zona urbana de Petrópolis. Por esses motivos, a comunidade nunca recebeu a atenção das prefeituras dos dois municípios.
Morando há alguns anos no local com mulher e quatro filhos, o catador Paulo Vinicius Matos, de 33 anos, só se recorda de incursões da polícia e de inspeções da Concer, concessionária que administra o trecho da BR-040. Na última delas, há dias, o acesso à favela, por onde os catadores passam com os carrinhos, foi fechado com uma grade, sob a alegação de que o movimento gera risco de acidentes na estrada.
- Só vi aparecer alguns políticos em eleição. Na verdade, nem sabia que aqui é Duque de Caxias - disse Matos.
Ele conta que existem hoje na comunidade cerca de 15 barracos, alguns de madeira, ocupando a encosta sem qualquer infra-estrutura. A energia elétrica é obtida de baterias de automóveis, que os moradores recarregam em oficinas mecânicas por R$5. Segundo Matos, há pessoas doentes devido à falta de saneamento e crianças fora da escola.
Policiais rodoviários federais contaram que a comunidade, assim como outras ao longo da rodovia, está em expansão. De acordo com eles, o principal risco é o trânsito de pedestres pela pista e a presença de animais, como cabritos e cavalos.
Setor de turismo teme perdas com favelização
Rogério Elmor, presidente do Petrópolis Convention Visitors Bureau, vê o crescimento de favelas na beira da BR-040 como o mais prejudicial à imagem da cidade e, conseqüentemente, ao turismo. Segundo levantamento da entidade, o turismo responde atualmente por 7% do PIB de Petrópolis.
- Essas comunidades estão crescendo demais. Cada dia tem mais gente andando a pé ou de bicicleta pela rodovia. É preciso que órgãos federais e estaduais trabalhem em conjunto com os municípios - diz.
A prefeitura de Duque de Caxias informou que a favela Deus Proverá não recebeu atenção nas últimas gestões por ficar em área de difícil acesso, longe do centro do município. O secretário de Urbanismo, Rodolfo Wanek, prometeu avaliar a situação dos moradores.

O Globo, 18/12/2005, Rio, p. 20
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