Imposição não vai impedir devastação

Diário do Pará-Belém-PA - 30/11/2004
Governo e entidades reúnem em Brasília para avaliar resultados do plano de combate ao desmatamento na Amazônia

Ministérios, organizações não-governamentais e representantes dos governos estaduais da Amazônia se reúnem, amanhã, em Brasília, para avaliar os resultados do plano de combate ao desmatamento na região. O encontro antecede uma série de medidas que o governo federal pretende adotar para conter a alta taxa de degradação da floresta, que, segundo estimativas extra-oficiais já atingem uma área recorde de 30 mil quilômetros quadrados. As medidas do governo incluem o envio para o Congresso Nacional do projeto de lei de lei de concessão florestal, o combate à grilagem (sobretudo na Terra do Meio e na área da rodovia BR 163) e a criação de novas unidades de conservação. Recentemente, o governo federal criou duas reservas extrativistas no Pará - a do Riozinho do Anfrísio, em Altamira, e Verde para Sempre, em Porto de Moz -, com uma área total de mais de 2 milhões de hectares. A criação de novas unidades de conservação em território paraense reacende a polêmica em torno da autonomia do Estado e da falta de medidas que regularizem a situação fundiária dos planos de manejo florestal sustentável das empresas madeireiras.

CANETADA -Indústrias Exportadoras de Madeira do Pará (Aimex) não se opõe à criação de reservas extrativistas no Pará, desde que a medida seja precedida de ampla discussão com o governo estadual e com a sociedade. "O que não se pode aceitar é a posição unilateral do governo federal que, numa só canetada, transfere terras do patrimônio do Estado para a União e informa que 2,25 milhões de hectares passam a pertencer às populações tradicionais. Quem não faz parte dessa categoria tem de cair fora do pedaço", critica Guilherme Carvalho, diretor técnico da Aimex. Segundo ele, a situação fica ainda mais confusa porque não se sabe exatamente o que é população tradicional. "Toda a comunidade local é necessariamente uma comunidade tradicional?", indaga o diretor. "Vai sobrar para o poder público, principalmente para o estadual, o ônus de colher as conseqüências do temporal que foi semeado pelo governo federal no terreno fértil das tensões no meio rural", alerta.

Tudo em segredo - Não é de hoje, lembra Carvalho, a perlenga em torno da criação de reserva extrativista gigante em território paraense. No primeiro embate, ainda no governo anterior ao de Jatene, o processo de criação da reserva Verde para Sempre estava sendo conduzido em segredo, sem nenhuma consulta ou discussão com o governo do Estado e com o público. Embora possua a segunda maior dimensão geográfica do país, o Estado do Pará é dono somente de 30% de seu território. Os 70% estão em poder da União, e a transferência expressiva de mais 2,25 milhões de hectares para a União com a criação das reservas Verde para Sempre e Riozinho do Anfrísio tolhem ainda mais o Estado de exercer sua administração no gerenciamento da ocupação espacial de seu território, opina Guilherme Carvalho. "Criar resex sobre o argumento de conter o desmatamento é um equívoco cujas conseqüências serão negativas tanto para as ditas populações tradicionais como para o restante da sociedade", contesta o diretor da Aimex. É preciso considerar, diz ele, que milhares de novos profissionais são formados pelas universidades todos os anos para atuar no mercado de trabalho. A criação de uma mega resex, garante, engessa investimentos no campo, fazendo aumentar ainda mais a concentração das populações no meio urbano. Sem emprego, essas pessoas passam a viver da economia informal. A descentralização das cidades depende da criação de novos empregos no meio rural o que só acontece se houver investimentos em novos empreendimentos. Guilherme Carvalho lembra que o pesquisador Alfredo Homma, da Embrapa, em seu livro "Extrativismo Vegetal na Amazônia - Limites e Oportunidades", conseguiu mostrar que o extrativismo constitui uma base de desenvolvimento de vulto bastante frágil, que se justifica mais pelo nível de pobreza dos seus habitantes e do mercado de mão-de-obra marginal.

FATORES - Para a Aimex, o desmatamento tem que ser combatido com uma ação enérgica, "o que não ocorre devido ao excesso de burocracia e a falta de estrutura do setor público". A entidade madeireira aponta fatores como regulação incompleta, instável e suscetível à intervenção política dos assuntos ligados ao meio ambiente, o ativismo judicial, a dificuldade de se obter licenças ambientais e a indefinição fundiária como causadores do aumento do desmatamento e da grilagem de terras. A concessão florestal, na opinião dos madeireiros, seria o melhor instrumento para permitir o acesso à exploração sustentada dos recursos florestais em terras públicas, gerando emprego, renda e possibilitando a obtenção da certificação florestal. O projeto de lei de concessão florestal, a ser encaminhado ao Congresso sofre crítica de algumas correntes dentro do Ibama, que temem perder a gerência sobre os recursos florestais com a criação do Serviço Florestal Brasileiro, prevista no projeto. A criação de resex de forma unilateral, argumenta Carvalho, "além de ferir a democracia, cria uma insegurança que impossibilita acreditar nas diretrizes governamentais". Projetos produtivos, que estão gerando emprego e renda, terão que ser desapropriados com a criação de resex, e as suas populações serão condenadas ao subdesenvolvimento sustentado, conclui.
Amazônia:Desmatamento

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