MPF acusa governo do Tocantins de estelionato ambiental

ISA - 06/04/2005
Ação Civil Pública afirma que, depois de captar milhões de reais para a recuperação e manejo da Área de Proteção Ambienta Ilha do Bananal/Cantão, o estado decide acabar com 89% da área protegida, zona rica em biodiversidade na transição entre o Cerrado e a Floresta Amazônica.

O Ministério Público Federal (MPF) no Tocantins entrou na semana passada com uma Ação Civil Pública na Justiça Federal, com pedido de liminar, contra decisão tomada pelo governo do Tocantins de reduzir uma das principais reservas ambientais do estado. O MPF solicita a invalidação da lei que autoriza a redução de 89% da Área de Proteção Ambiental (APA) Ilha do Bananal/Cantão. A proposta de redução do território da APA – de 1,7 milhão para 185 mil hectares - se deu por meio do Projeto de Lei no 7, de 16 de março de 2005, aprovado pela Assembléia Legislativa do Tocantins na quarta-feira 30 de março e sancionado pelo governador Marcelo Miranda (PSDB) dois dias depois.


A APA Ilha do Bananal/Cantão, criada em maio de 1997, é parte de um corredor ecológico, composto também pelo Parque Nacional do Araguaia, outras Unidades de Conservação e pelas Terras Indígenas da Ilha do Bananal. O corredor está localizado na divisa entre Tocantins e os estados do Pará e do Mato Grosso. De acordo com o Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins), autarquia responsável pela execução da política ambiental do estado, a redução da APA é necessária pela dificuldade de fiscalização da área. O governo do estado afirma que a redução também é uma solicitação dos municípios cujos limites encontram-se dentro da reserva. A APA estaria atrapalhando o desenvolvimento econômico da região. O Ministério Público Federal, entretanto, afirma que a razão principal para a mutilação da APA é a pressão dos setores agropecuários, em especial dos plantadores de soja e de arroz.

Em seu pedido de liminar, o procurador federal Adrian Pereira Ziemba acusa a Naturatins e o governo estadual de estelionato ambiental. Argumenta que, após a criação da APA, o estado captou recursos de fontes nacionais e internacionais, públicas e privadas, para a recuperação ambiental e implementação do plano de gestão da reserva e, agora, decide diminuir drasticamente seus limites. A situação beira o escárnio”, escreveu o procurador na Ação Civil Pública. A Ilha do Bananal/Cantão foi depositária de vultosos recursos públicos e privados no curso de sua manutenção e consolidação, não obstante a curta existência”, afirma Ziemba.

Plano subvertido

O projeto de desenvolvimento sustentável da reserva – denominado Projeto Cerrado -, baseado no plano de gestão da APA, recebeu, apenas do Departamento para o Desenvolvimento Internacional, órgão do governo britânico, mais de R$ 1, 3 milhão para a realização de eventos, manutenção de equipamentos, diárias para pessoal e manutenção de um escritório de apoio ao projeto. A legislação impõe o pagamento de determinada quantia para compensar a degradação causada por obra ou atividade poluidora e, aplicado o recurso exclusivamente em atividade preparatória, resolve o estado reduzir a APA”, redigiu o procurador. A implementação de grandes projetos de agricultura irrigada, subvertendo os planos do governo federal de estabelecer no local pólos de agricultura familiar, estaria por trás da resolução de diminuir os limites da APA.

Em sua argumentação, o representante do MPF cita documento extraído do próprio Projeto Cerrado, no qual consta a análise de que a área de 16.780 km2 tem alto valor ambiental, mas está sob forte pressão da fronteira agrícola e da colonização de migrantes de diversas regiões do país. Atualmente, há na APA uma concentração de 28 projetos de assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e do Instituto de Terras do Estado do Tocantins (Intertins), além de duas colônias de pescadores. Essas populações têm diante de si o desafio de conciliarem o seu desenvolvimento socioeconômico à conservação ambiental”.

Biodiversidade diminuída

A região da reserva ameaçada é de transição entre o Cerrado e a Floresta Amazônica e abriga grande diversidade biológica. O Departamento de Engenharia Ambiental da Universidade Federal do Tocantins divulgou ontem (5/4) - quando cerca de 300 estudantes protestaram diante do Palácio Araguaia, sede do governo, contra a redução da reserva – uma lista com as espécies de aves e peixes que serão afetadas pela diminuição da APA. O Ibama qualifica a reserva Ilha do Bananal/Cantão como um escudo de proteção ambiental ao norte da Ilha do Bananal, maior ilha fluvial do mundo, com mais de 2 milhões de hectares, onde mamíferos raros ou em vias de extinção têm seu habitat, caso do tamanduá-bandeira, lobo guará, onça pintada, tatu canastra, o cervo do pantanal e botos, entre outros.

A APA constitui também um conjunto de áreas preservadas com outras seis Unidades de Conservação estaduais e federais de categorias diferentes, além das Terras Indígenas localizadas na Ilha do Bananal, dos povos Javaé e Karajá. Essas UCs e as TIs formam o Corredor Ecológico Araguaia-Bananal. Com base nos documentos analisados, o procurador federal constatou que a APA não foi considerada como inserida no mosaico de Unidades de Conservação e Terras Indígenas.

O MPF pede à Justiça que o governo estadual seja obrigado a continuar com os trabalhos de fiscalização e de implementação do plano de gestão da reserva. Solicita também que, antes de qualquer ação, estudos técnicos e consultas públicas sejam realizadas para avaliar os efeitos da redução da área. Em caso de descumprimento destas determinações, o MPF solicita a cobrança de multa no valor de R$ 100 mil. O governo do estado e o Naturatins, além do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), têm até o fim desta quarta-feira, 6 de abril, para se manifestar em relação à Ação Civil Pública.
UC:APA

Unidades de Conservação relacionadas

  • UC Leandro (Ilha do Bananal/Cantão)
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