O Instituto Chico Mendes mostra a que veio

OESP, Vida, p. A20 - 22/08/2007
O Instituto Chico Mendes mostra a que veio

Marcos Sá Corrêa

O Instituto Chico Mendes nem precisou ficar pronto para mostrar a que veio. Acaba de abrir nada menos de doze unidades de conservação na Amazônia à Empresa de Pesquisa Energética. O Ministério do Meio Ambiente está apoiando o inventário hidrelétrico do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) com áreas de proteção integral nas bacias dos Rios Trombetas, Aripuanã, Juruena, Sucurundi, Branco e Jari.

As licenças concedidas em tempo recorde pelos novos encarregados de administrar a conservação da biodiversidade no País incluem, por exemplo, o Parque Nacional do Juruena, a Estação Ecológica de Iquê, a Reserva Biológica do Trombetas e a Floresta Nacional de Saracá-Taquera. Não fazem discriminação entre modelos mais ou menos estritos de reservas. Puseram todas no mesmo pacote.

A pressa que as embaralhou leva a marca da nova burocracia ambiental. Antes, ela podia ser muito ruim, mas não era tão ruim assim. O pedido da Empresa de Pesquisa Energética chegou ao governo em janeiro, quando o assunto ainda estava nas mãos do Ibama e a ministra Marina Silva começava a ensaiar uma espécie de resistência à invasão da Amazônia pelo PAC, a partir do Rio Madeira.

Depois, num despacho com o presidente Lula, ela trocou os pruridos pelas prioridades oficiais e ganhou de prêmio o Instituto Chico Mendes. Criado por medida provisória, ele foi a primeira obra do programa a sair do papel.

ESTRÉIA

E eis o instituto, mostrando que as coisas efetivamente começaram a se mexer no Ministério do Meio Ambiente como queria o Palácio do Planalto. Sem o Chico Mendes, remanchava-se.

O ofício 061/2007 chegou ao diretor de Ecossistemas do Ibama em janeiro. No papel, o diretor de Estudos de Energia Elétrica da empresa de pesquisa, José Carlos Miranda, pedia ao diretor de Ecossistemas do Ibama, Marcelo Bastos Françoso, que franqueasse a Bacia do Trombetas ao "planejamento geral do setor elétrico nacional". Quem sabe o que isso quer dizer traduz o pedido como "abertura de picadas e clareiras, colocação de marcos e réguas de medição, instalação de postos fluviométricos e sedimentométricos, além de sondagens geológicas".

Isso é o mínimo. O máximo todo mundo sabe qual é num país que, três décadas atrás, para o desgosto da geração de militantes que agora está no poder, afundou o Parque Nacional de Sete Quedas na Represa de Itaipu. Essas coisas pareciam acontecer naquele tempo porque o regime era militar. No atual regime civil, como costuma afirmar a ministra Marina Silva, funciona uma tal de "transversalidade".

OFÍCIOS ACELERADOS

O Ibama recebeu aquele primeiro ofício com um pé atrás. Alegou que a pesquisa não interessava às unidades de proteção integral. E cobrou dos responsáveis os detalhes sobre trabalho de campo que pretendiam fazer nas reservas. Podia ser só para ganhar tempo. Mas a empresa nem lhe respondeu.

Preferiu o atalho aberto pelo Instituto Chico Mendes. Em ritmo de PAC, o diretor de Unidades de Conservação do novo organismo, João Paulo Capobianco, recebeu no dia 13 de julho o ofício 1167/2007, reiterando a solicitação.

Aliás, cobrou-lhe urgência na aprovação de licença para atuar em doze unidades de conservação na Amazônia, invocando os pedidos feitos em oito ofícios, um deles - o do Rio Branco - datado da véspera. "Temos um prazo para concluir os trabalhos que inclusive estão contemplados e acompanhados no Plano de Aceleração do Crescimento", dizia o diretor de Estados José Carlos Miranda, que, pelo visto, no caminho do PAC, não admite nem vírgula.

Diante da solidez irretorquível desse argumento técnico, a licença começou a sair no fim de julho, já em papel timbrado do Instituto Chico Mendes, que não tem quadro de pessoal nem patrimônio próprio. Mas, no essencial, parece estar funcionando muito bem. Melhor, só piorando muito.

É jornalista e editor do site O Eco (www.oeco.com.br)

OESP, 22/08/2007, Vida, p. A20
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