O resgate do verde da serra

JB, Cidade, p.A26 - 11/09/2005
O resgate do verde da serra
Mapeamento inédito de ONG em Petrópolis aponta soluções para desmatamento
Duilo Victor
Um mapeamento feito por meio de fotos aéreas, com um nível de detalhamento jamais feito em um área de proteção ambiental do país, mostrou que nem tudo está perdido na recuperação de problemas ambientais da região de Petrópolis, onde vivem cerca de 300 mil pessoas. 0 mapa da APA Petrópolis foi concluído depois de um ano de trabalho, por uma equipe multidisciplinar do Instituto Terranova, a pedido do conselho gestor da área. Feito em uma escala que permite ver até mesmo o tamanho de uma piscina nos fundos de uma casa, a montagem fotográfica servirá de instrumento para fiscalização de crimes ambientais e gestão ordenada de ocupação do solo. 0 mapa faz inveja ao GoogleEarth, fotos do planeta que viraram mania entre os internautas de todo o mundo.
A perspectiva de aumento no estado de degradação do meio ambiente foi atenuada pela descoberta de um número de áreas de florestas preservadas maior que o esperado. Áreas que antes eram usadas para atividade agrícola e que hoje são exploradas como hotéis-fazenda, por exemplo, permitiram que a mata se recuperasse.
Mesmo dentro do Centro Histórico, uma das regiões mais urbanizadas da cidade, foi observada uma reserva de Mata Atlântica ao lado da Avenida Ipiranga, com variedade de espécies só encontrada em regiões de mata intocada, com avançado estado de preservação . Esta descoberta oferece um argumento a mais para ambientalistas e representantes sociais na reivindicação à prefeitura de transformar a reserva da avenida em um parque natural municipal.
Da área de 60 mil hectares da APA, que abrange também os municípios de Guapimirim, Magé e Duque de Caxias, 72,4% é de formação florestal. Em bom estado como na reserva da Rua Ipiranga, ainda há 18,5%, mais do que o esperado pelos especialistas.
- 0 mapeamento deu uma realidade melhor do que imaginávamos. Esse pensamento de que já está mesmo tudo estragado só serve para quem quer degradar a natureza ainda mais - conta a diretora da APA Petrópolis, Yara Valverde, explicando que o sucesso de uma reserva florestal em um centro urbano se deve exclusivamente ao planejamento de ocupação. Ainda na década de 1840, D. Pedro II encomendou ao engenheiro Júlio Koeller, um plano de urbanização para o Centro que proibia a construção de casas com os fundos para o rio e a construção no alto dos morros.
- 0 Plano Koeller mudou a forma como se construía casas durante a colonização portuguesa, em que não se importava com a preservação da mata no topo dos morros. Hoje a reserva da Rua Ipiranga está mais bem preservada que áreas onde a urbanização não chegou, mas que foi afetada pela agricultura - explica a diretora.
Apesar de o estudo ter identificado um maior número de áreas de preservação florestal, Yara disse que a prioridade será monitorar regiões de maior altitude onde estão importantes mananciais, que têm sido constantemente degradados com queimadas e ocupações desordenadas.
- As regiões de Moinho Preto, Alto da Serra, Cachambu e Bonfim são os pontos mais críticos. Nesses locais ficam os principais pontos de captação de água e nos períodos de estiagem, como ocorreu mês passado, o abastecimento corre risco de ficar comprometido em alguns bairros - alerta.
As fotos aéreas revelam, inclusive, que a comunidade que vive às margens do Rio Bonfim já avançam para a área do Parque Nacional da Serra dos órgãos. Ao contrário de uma Área de Preservação Ambiental, em um parque nacional não pode haver uso direto do solo.
- Observamos que a ocupação irregular na APA não é feita apenas pela favelização, mas em certos casos por condomínios de faixa social mais elevada - afirma o geógrafo e coordenador geral do Terranova, Marcelo Mattos de Freitas. Ele explica também que só em um próximo levantamento será possível afirmar se houve avanço na área degradada. Em tese, segundo Mattos, a descoberta de um número maior de áreas preservadas, inclusive de campos de altitude (acima de 1.750 metros) - onde ele diz viver espécies de plantas não encontradas em nenhum outro lugar - se deve em parte pela nitidez alcançada pelo mapeamento, feito em uma escala de 1 por 10 mil.
Para Yara Valverde, o mapeamento se tornou um grande instrumento para facilitar a gestão e recuperação de áreas degradadas, que só voltarão ao normal em 20 ou 30 anos.
-Até mesmo a Polícia Federal e a Superintendência Estadual de Rios e Lagoas (Serla) já estão usando os dados do mapeamento para suas ações.

Estudo impulsionará criação de parque
De acordo com o levantamento do Terranova, cerca de 15% da APA, ou 8.600 hectares, são tomados por gramíneas, um sinal de degradação do meio .ambiente. Mas nem tudo é cinzento no futuro: a prova tirada por meio do mapeamento da Área de Proteção Ambiental de Petrópolis de que a reserva da Avenida Ipiranga, com cerca de 230 mil metros quadrados, é uma importante área de preservação da Mata Atlântica - e no meio do Centro Histórico - será mais um argumento para fazer do local um parque natural municipal. Há quatro anos, o Comitê Pró-Parque Ecológico, formado por 20 ONGs e associações de classe, tenta conquistar o apoio popular para que a prefeitura finalmente assine o decreto que garante a preservação.
-Seria um dos maiores parques ecológicos em área urbana do mundo. Esse decreto, que está há pelo menos dois anos para ser assinado, daria condições para o parque receber verba do governo federal - responde Marcelo Lago, coordenador do comitê e presidente da associação de moradores do Centro Histórico.
A pressa em transformar a região num parque, segundo Lago, é justificada pelas constantes ameaças sofridas pela reserva, que já correu risco de ter um condomínio em seu terreno, além dos vários casos de trilhas na mata abertas irregularmente, uso indevido de nascentes de água e até campos de futebol improvisados.
Caso seja definitivamente transformado em parque municipal, o comitê já dispõe de um projeto que faria da reserva um ponto turístico.
JB, 11/09/2005, p. A26
UC:APA

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