Para dar certo, tem que continuar

O Globo, Razão Social, p. 3 - 02/02/2010
Para dar certo, tem que continuar
Projeto da Coppe/ UFRJ em Arraial do Cabo não sabe se terá patrocínio

Camila Nobrega
camila.alves@oglobo.com.br

O conceito de responsabilidade social possui várias diretrizes e está em constante transformação, mas, entre todas elas, pode-se dizer que uma certeza permanece: nem sempre um projeto bem intencionado alcança todos os seus objetivos.
É essa experiência que os integrantes do projeto Ressurgência, da Coppe/UFRJ estão vivenciando no município de Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro.
Apesar de ter alcançado a meta de ampliar a participação social em relação à Reserva Extrativista Marinha de Arraial, o projeto ainda não ganhou força entre os membros da comunidade mais tradicional do município: os pescadores.

Há cerca de três anos, a Coppe/ UFRJ recebeu um pedido de ajuda da Marinha em Arraial do Cabo, para estabelecer uma comunicação com outros atores sociais relacionados à Reserva Extrativista Marinha do município. Em seguida, o mesmo pedido veio do Ibama e de grupos locais de pescadores. Tudo porque a Coppe, que atua na Região dos Lagos, é vista como um bom canal de comunicação entre os grupos. Pesquisadores da Coppe criaram, então, o Ressurgência - Rede Arraial Sustentável, com o patrocínio do programa Petrobras Ambiental.
E, no decorrer do projeto, a instituição de fato ampliou o diálogo, especialmente entre agentes do município e funcionários da própria Reserva Extrativista da Marinha. Mas os pescadores não se sentiram incluídos no processo.

Joaquim Carvalho, pescador em Arraial há mais de 30 anos, conta que alguns pescadores fizeram oficinas oferecidas pela Coppe, mas as principais demandas do grupo não foram atendidas durante o projeto:

- Para melhorar, o projeto tinha que continuar e teriam que nos ouvir mais. Ganhamos radiotransmissores para facilitar a comunicação no mar em caso de perigo, ou até denunciar a pesca predatória. Mas o principal para a gente é ter espaço na prefeitura e fazer com que eles criem formas de reduzir as traineiras, porque o peixe está escasso - diz o pescador, apontando uma traineira que se aproximava de um cardume de peixes visíveis mesmo de longe, no mar azul de Arraial.

Além dele, engrossam o coro o presidente da Associação de pescadores da cidade, Manuel Mendonça, e os pescadores Otavio Ferreira e Roberto Carlos Júnior, integrantes de grupos de diferentes praias de Arraial. Embora admitam que é difícil desenvolver um projeto com os pescadores, já que há muitas rixas entre os grupos e resistência a novas técnicas, eles pedem mais participação na formulação de cursos e reuniões com a prefeitura. Como o patrocínio da Petrobras acabou em 2009, eles dizem que ficou faltando um caminho pela frente.

De acordo com o pesquisador Ricardo Coutinho, um dos coordenadores do projeto, o ideal era que o Ressurgência realmente continuasse, para chegar a um estágio amplo de participação da comunidade. Coutinho ressalta, porém, que, a partir do projeto, uma sugestão de projeto de lei foi encaminhada ao município para a criação de uma Guarda Marítima e Ambiental de Arraial do Cabo.

- O objetivo é reduzir a pesca predatória e o turismo desordenado no mar. A criação da Guarda vai ajudar muito os pescadores. E só foi possível rastrear a necessidade de criação desse mecanismo por meio do levantamento de dados que foi feito no projeto.
Outro coordenador do projeto, o pesquisador Rogério Vale afirma que o contato com os pescadores foi difícil no início, mas ampliou-se no decorrer do programa:
- Oferecemos uma oficina de pesca sustentável. Ninguém foi. Percebemos que eles não sabiam o que era sustentável. Vimos que faltava se adaptar a eles e fizemos uma de saúde e segurança na pesca.
Deu muito mais certo.

Além das oficinas, a Coppe ofereceu um curso focado em gestão socioambiental, que teve muitos alunos funcionários do município e da Reserva Extrativista. A ideia era capacitar pessoas de Arraial, para ampliar o conhecimento em torno da reserva.
Ao fim do curso, os 29 alunos, que tiveram os estudos custeado pela Petrobras, fizeram monografias sobre o assunto, formando um grande arquivo que será usado pelos agentes públicos e acadêmicos do local.

Também foram oferecidas oficinas para professores de escolas, com enfoque ambiental.
Segundo os coordenadores do Ressurgência, os professores foram grandes parceiros e, além de alguns terem participado do curso de pósgraduação, levaram grande parte do conhecimento para as salas de aula. Outra atividade fruto do projeto foi a criação de um jornal ("O Cabistão") e uma rádio local. Agora, o grupo de jovens participantes busca uma maneira de manter os dois sem o apoio do Ressurgência, como conta Izabelle Félix, de 23 anos, moradora de Arraial:
- A rádio e o jornal são ótimas oportunidades de a gente discutir as questões da cidade.
Sem o patrocínio da Petrobras, estamos buscando um jeito de continua-los.
Até o momento, os coordenadores não sabem se o o projeto terá continuidade.

O Globo, 02/02/2010, Razão Social, p. 3
UC:Reserva Extrativista

Unidades de Conservação relacionadas

  • UC Marinha do Arraial do Cabo
  •  

    As notícias publicadas neste site são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.