Parque Nacional Marinho dos Abrolhos Luta Pela Zona de Amortecimento e Resiste a Empreendimento

www.redeprouc.org.br - 28/09/2007
A região de Abrolhos compreende um mosaico de ambientes marinhos e costeiros margeados por importantes remanescentes de mata atlântica, incluindo recifes de coral, fundos de algas, manguezais, praias e restingas. Lá podem ser encontradas várias espécies endêmicas como o coral-cérebro, além de mamíferos ameaçados de extinção, como a baleia jubarte. A região tem a maior biodiversidade do Atlântico Sul e foi declarada, em 2002, área de Extrema Importância Biológica pelo Ministério do Meio Ambiente. O primeiro Parque Nacional Marinho do Brasil foi criado justamente nessa região, em 1983, ao largo das ilhas que compõem o arquipélago dos Abrolhos, onde se encontram algumas das mais importantes colônias de aves marinhas do país.

A zona de amortecimento (ZA) do Parque de Abrolhos vem sendo discutida pela sociedade civil e órgãos governamentais desde 2003, época dos primeiros estudos que subsidiaram tecnicamente sua definição, quando a Agência Nacional do Petróleo (ANP) ofereceu grandes áreas para a exploração de hidrocarbonetos no banco dos Abrolhos. Neste primeiro momento os conhecimentos disponíveis sobre a biodiversidade, e as características sociais e econômicas da região, foram sobrepostos aos impactos da produção de óleo e gás, mostrando-se incompatíveis.

Desde essa época a criação da ZA vem sendo alvo de ativos debates pela sociedade civil, especialmente através do Conselho Consultivo do Parque de Abrolhos, formado por representantes das prefeituras locais, do governo do estado, da Marinha, das colônias de pesca, do setor turístico e de ONGs. Além dos cenários de derramamento de óleo resultantes das simulações, foram considerados para a proposição dos limites da ZA: as características biológicas (evidências de conectividade biológica, abrangência dos principais habitats) e oceanográficas (geomorfologia e sistemas de correntes) da região dos Abrolhos e características sócio-econômicas da área, como a dinâmica da pesca e do turismo.

Instituída formalmente em maio de 2006, por meio de uma portaria do IBAMA, a ZA de Abrolhos foi suspensa judicialmente em junho deste ano, porque atingiu em cheio interesses econômicos e políticos fortíssimos. Foi um entrave que surgiu frente ao maior empreendimento de carcinicultura da costa brasileira, da Cooperativa de Criadores de Camarão do Extremo Sul da Bahia (COOPEX). Já em maio de 2006 o ex-senador João Batista Motta PSDB/ES tentou derrubar a ZA com um decreto legislativo, mas a imprensa apurou que ele e outros quatro familiares são sócios do empreendimento.

Conhecedores da insustentabilidade ambiental e social do projeto e consequentemente da posição contrária do IBAMA, os empreendedores partiram para ações judiciais para tentar suspender a ZA. Conforme denunciado pela revista Carta Capital de julho deste ano, o advogado Marcelo Palma, além de articulador da ação que suspendeu a ZA, é assessor jurídico da Bahia Pesca (órgão estadual de fomento à pesca e aqüicultura), advogado das prefeituras na ação contra a Reserva Extrativista do Cassurubá (que quando criada inviabilizará definitivamente o empreendimento da COOPEX), e é também o advogado dos empreendedores!

A suspensão da zona de amortecimento fundamenta-se apenas na forma (portaria) e não no mérito da ZA, foi uma brecha de interpretação da legislação ambiental. E quanto à forma o governo encontrará a solução mais adequada. É uma questão de interesses coletivos contra interesses individuais e por isso estamos confiantes na manutenção da zona de amortecimento. Prova disso é que recentemente a Justiça Federal acolheu ações do Ministério Público e determinou a paralisação dos licenciamentos de carcinicultura na Bahia.

Os argumentos das prefeituras são puramente econômicos, favorecendo grupos empresariais e políticos em detrimento de seu papel de trabalhar pelos interesses coletivos, sociais e que conduzam a um desenvolvimento sustentável. As populações locais precisam de instrumentos como a ZA, que garantam a proteção dos ecossistemas que as sustentam e protejam-nas da pressão dos grandes empreendimentos.

A derrubada da ZA significa um retrocesso nas políticas de desenvolvimento sustentável da região dos Abrolhos. Os limites da zona foram estabelecidos após anos de pesquisas sólidas e trabalhos técnico-científicos de modelagem da dispersão de óleo em cenários de derramamento, simulados em função dos ventos e correntes predominantes na região. Além disso, o assunto foi debatido com representantes dos governos federal, estadual e municipais, setor produtivo (pesca, turismo) e pesquisadores. Agora a ação de prefeituras põe tudo a perder.

A ZA não impede o desenvolvimento econômico, apenas visa assegurar um desenvolvimento sustentável, com atividades como o turismo e a pesca, que empregam hoje cerca de 100.000 pessoas na região. Não se pode arriscar isso tudo por um empreendimento que beneficia cerca de 20 associados. A COOPEX definitivamente escolheu o local mais impróprio do país para se instalar.

A única restrição da ZA é para a exploração de petróleo e gás, devido ao seu alto risco ambiental no banco de corais de Abrolhos. A ZA sinaliza para o mundo que o desenvolvimento aqui não se faz a qualquer custo, pelo contrário, os riscos ambientais são estudados e evitados, colocando-se em prática o princípio da precaução estabelecido desde a Agenda 21 e preceito fundamental do Direito Ambiental.

O Brasil já é auto-suficiente em petróleo e não precisa destruir o maior banco de corais do Oceano Atlântico Sul para produzir combustível fóssil, principalmente quando o mundo inteiro discute o aquecimento global e busca fontes alternativas de energia. Também não dá para conciliar o maior empreendimento de carcinicultura do país com a área de maior biodiversidade da costa brasileira.

Sem a zona de amortecimento o Parque fica exposto à possibilidade de impactos ambientais sem precedentes. Além do petróleo, a carcinicultura, por exemplo, também não é novidade no Brasil nem no mundo. Diversos países já foram arrasados por esta atividade, como o Equador e o Vietnã. No Brasil os estados do Ceará e Rio Grande do Norte não podem nem ouvir falar em carcinicultura. A destruição ambiental lá é gritante, basta visitar. Pescadores e ribeirinhos de Caravelas que defendem a Reserva Extrativista estiveram lá e conheceram de perto o caos que resta dos empreendimentos. Para se ter uma idéia, em uma só cidade (Aracati/CE), mais de 3.000 pessoas perderam seus postos de trabalho no ano passado com a falência das fazendas de criação de camarão.

Por fim o SNUC, quando trata da obrigatoriedade de autorização do órgão gestor da unidade de conservação afetada, fala em empreendimentos que afetem a UC ou sua zona de amortecimento. O empreendimento da COOPEX, pelas dimensões que possui, afeta o Parque Nacional e se for preciso provaremos isso na Justiça. O IBAMA já recorreu da decisão que suspendeu a ZA e em breve ela deve ser reconstituída. Da mesma forma o Governo Federal deve criar a qualquer momento a Reserva Extrativista Marinha de Cassurubá, inviabilizando definitivamente a tentativa da carcinicultura no principal estuário do banco dos Abrolhos.
UC:Parque

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