Pousada não tinha licença ambiental

OESP, Metrópole, p. C1 - 06/01/2010
Pousada não tinha licença ambiental
A Sankay, onde 3 pessoas morreram, é anterior à proibição de construção no local, mas não obteve autorização

Felipe Werneck
Ilha Grande

A Pousada Sankay, na Praia do Bananal, onde estavam 3 dos 31 mortos na tragédia do dia 1, não tinha licença ambiental para funcionar, afirmou ontem o superintendente regional do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) na Baía da Ilha Grande, Júlio Avelar. Isso significa que, sob o ponto de vista ambiental, a situação da pousada era irregular. Uma estimativa apresentada pelo Inea indica que menos de 10% das construções em Ilha Grande tenham licenciamento ambiental.

"Segundo informações da prefeitura, a Sankay também não teve alvará para a construção. Foi construída de maneira irregular. Depois, recebeu um alvará de operação", disse Avelar. Procurada, a Assessoria de Imprensa da prefeitura forneceu o telefone do procurador-geral do Município, André Gomes Pereira, que poderia comentar a situação, mas ele não foi encontrado até a noite de ontem. Mesmo com os dois alvarás, a licença ambiental seria necessária.

De acordo com o Inea, a pousada surgiu a partir da reforma de uma antiga casa de pescadores, em 1992. É, portanto, anterior ao Plano Diretor que instituiu, em 1994, o zoneamento da Área de Proteção Ambiental (APA) de Tamoios (decreto n 20.172). A partir daí, ficou proibida a construção na região costeira. A APA Tamoios abrange as 93 ilhas da baía.

Avelar ressalvou que a Sankay poderia ter eventualmente obtido a licença, caso tivesse seguido todos os trâmites necessários, e que isso não teria evitado a tragédia. Ele também reconheceu que falta fiscalização na ilha para exigir a licença. Como a pousada fica numa Zona de Ocupação Controlada (ZOC) da APA, ela seria "licenciável". No entanto, para se enquadrar neste critério, uma construção deve seguir uma série de parâmetros e restrições, entre elas não ficar sobre o costão rochoso.

A partir de hoje, o Inea e a Defesa Civil vão começar a identificar construções em áreas de risco em Ilha Grande. O objetivo é demolir os imóveis, caso haja risco de desabamento.

Os responsáveis pela Sankay não foram localizados ontem. Os donos, Geraldo e Sônia, perderam a filha na tragédia. Eles divulgaram no site da pousada uma mensagem aos clientes e amigos. "Informamos que as atividades da Pousada Sankay estão suspensas por tempo indeterminado e que ressarciremos os valores depositados a todos aqueles com reservas feitas e pagas antecipadamente".

Mesmo com a ressalva de que não poderia falar em nome da Sankay, o representante da Associação de Pousadas da Enseada do Bananal (Apeb), Paulo Minhoca, comentou a informação do Inea. "Quando a maioria das pousadas foi construída não havia lei específica. Acredito que a informação do Inea seja baseada nas leis atuais."


Plano de ocupação de Angra será alterado
Governo estadual quer reverter parte de decreto que libera construções

Alexandre Rodrigues
Rio

Para tentar evitar que o decreto publicado no ano passado pelo governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), vire um instrumento para a ocupação de faixas litorâneas em Angra dos Reis, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) pretende substituí-lo pelo novo plano de manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) de Tamoios - que inclui uma faixa litorânea de 80 quilômetros - a face da Ilha Grande voltada para o continente e cerca de 90 ilhas da baía. Como o plano não está completo, o Inea vai propor a antecipação das diretrizes para a Ilha Grande, sem revogar o decreto.

"Já estava em nossos planos a revisão do plano de manejo, mas houve dificuldades na contratação dos estudos. Como já temos todo o levantamento da Ilha Grande, vamos levar ao conselho diretor da APA a discussão sobre a situação concreta de cada zona, compatibilizando o plano de manejo com o plano diretor de Angra", disse o diretor de Biodiversidade e Áreas Protegidas do Inea, André Ilha, que diz ser possível fechar a nova diretriz em 30 dias.

O decreto 41.921/09, assinado por Cabral em junho, abriu caminho para a construção em 10% de terrenos já degradados na APA Tamoios, onde fica a Enseada do Bananal. A legislação anterior, de 1994, só permitia a ampliação limitada de imóveis pré-existentes. Segundo Ilha, essa legislação favoreceu uma série de fraudes para legalizar obras irregulares, como mostrou a Operação Carta Marcada, da Polícia Federal, que prendeu 19 pessoas em 2007.

Ilha admite que o decreto foi feito sem debate com a sociedade e explica que o novo plano vai definir com precisão as áreas em que poderiam ser permitidas construções. "É tirar algum ganho ambiental com um fato consolidado, respeitando critérios ambientais e de risco. Não é regularizar o inaceitável."

O presidente do Conselho de Comitê de Defesa da Ilha Grande (Codig), Alexandre Oliveira e Silva, diz que o novo plano é bem visto pelas entidades locais. O Codig se reunirá no dia 13 para avaliar a proposta, mas Silva defenderá a revogação do decreto. "O decreto não pode ser o ponto de partida. Cabral não quer admitir que errou, mas esse decreto pode criar disputas na Justiça."

Segundo o procurador da República em Angra dos Reis Fernando Lavieri, o Inea foi notificado pelo Ministério Público Federal de que responderia ações individuais se concedesse licenças baseadas no decreto. Para o procurador, o ato é inconstitucional. "A criação de unidade de conservação pode ser feita por decreto, mas só se altera por lei. É um desnível da Constituição em favor do Meio Ambiente." O pedido de Ação Direta de Inconstitucionalidade dele está sob análise na Procuradoria Geral da República, em Brasília.


Total de mortos chega a 52; há 2 desaparecidos
Corpos de duas turistas de Arujá são encontrados; comunidade isolada tenta retomar rotina

Bruno Lousada
Rio
Alfredo Junqueira
Angra dos Reis

Os corpos de Emanuele Rodrigues, de 32 anos, e de Fernanda Muraca, de 25, que estavam na casa na Enseada do Bananal onde um grupo de 17 pessoas da cidade paulista de Arujá passava o réveillon foram identificados por meio da arcada dentária, de acordo com o diretor do Instituto Médico-Legal, Frank Perlini. Os corpos, encontrados ontem, foram encaminhados para o IML do Rio, onde parentes das jovens os esperavam.

"Por incrível que pareça, quando lá no hotel veio a notícia do encontro dos dois corpos, nós comemoramos. Veio a confirmação final aqui no IML e pela primeira vez choramos a morte das meninas. É um ciclo que se fecha. Os pais estão arrasados, mas aliviados. Não existe nada mais angustiante que esperar cinco dias pela confirmação da morte de um filho. É uma sensação mista, horrorosa. Agora vamos levar nossas meninas para descansar", disse Pedro Cordeiro, tio de Emanuele.

Dos 17 amigos de Arujá, 11 morreram por causa do deslizamento de terra que atingiu o local. Bombeiros e mergulhadores ainda procuram a última vítima, Roseli Pedroso, moradora da região. A chuva que castigou Angra dos Reis no dia 1 provocou a morte de 52 pessoas.

Após quatro dias de isolamento, com falta d"água e luz, os moradores de Vila Velha, em Angra, tentam voltar à rotina. Até o início da noite de anteontem, as 300 famílias da comunidade e de condomínios de luxo da região, a cerca de 10 km do centro, só conseguiam chegar a outros bairros de barco. A única via, a Estrada do Contorno, estava interditada desde o dia 1. Em Vila Velha, o empresário Eike Batista é dono de uma mansão e chegou a ajudar os moradores. O auxílio, porém, foi considerado irrisório por alguns. Ele deu 300 garrafas de 1,5 litro de água, 50 sacos de gelo e disponibilizou uma de suas lanchas.

Por toda a Estrada do Contorno, de 18 km, o cenário é de destruição. Toneladas de terra e lama se acumulam na pista - uma via de mão-dupla. Em muitos pontos, a estrada está aberta em meia pista. Uma imensa pedra deslizou da encosta que margeia a via e parou praticamente na porta da casa de Beatriz Guimarães, de 70 anos, prima do ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães.

Ontem, no Morro da Carioca, os bombeiros buscavam pelo corpo da última desaparecida - Alessandra Emídio de Carvalho, de 11 anos.
Colaborou Pedro Dantas


55% dos turistas cancelam reservas em Ilha Grande

Alexandre Rodrigues

A tragédia provocada pelas chuvas em Angra dos Reis está provocando uma debandada de turistas em todo o litoral sul do Estado do Rio. Segundo o presidente da seção fluminense da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), Alfredo Lopes, os hotéis de Angra tiveram quase 40% das reservas canceladas desde a tragédia. Em Ilha Grande, o índice chega a 55%. Houve cancelamentos também em Paraty, que sofre com as interdições na Rio-Santos.

"Hotéis que estavam com 98% dos quartos ocupados no réveillon viram a ocupação despencar para 30% no dia seguinte. A comoção e a cobertura intensiva da mídia estão dando a impressão errada de que áreas que não foram afetadas são de risco", disse Lopes. Para ele, a rede hoteleira da região amargará grande prejuízo. "A ocupação em janeiro deve ficar abaixo de 50%."

OESP, 06/01/2010, Metrópole, p. C1
UC:APA

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