Preservação privada

O Eco - 17/04/2007
Manoel Pacheco é um dos guias mais antigos da Chapada dos Veadeiros. Nativo de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, chegou ali em 1982, quando a cidade de Alto Paraíso de Goiás, conhecida como o ‘portal da Chapada’, ainda não havia se transformado num dos pólos de ecoturismo mais conhecidos do país. Aliás, Pacheco deu uma contribuição primordial para popularizar as magníficas cachoeiras da região. Eu andei por todo lado, o que mais gosto de fazer é entrar no mato sem trilha, diz ele ao lembrar como foi descobrindo os lugares que hoje são atrativos famosos.

O conhecimento de Pacheco sobre a região, que já lhe rendeu até o título de melhor guia de turismo do Brasil, pelo Guia 4Rodas de 2006, não se restringe aos caminhos que fazem a felicidade do turista. Sua memória das mudanças pelas quais passou a Chapada dos Veadeiros nos últimos anos dão idéia de como a degradação ambiental alterou amostras importantes do cerrado na região.

Passavámos dentro das maiores fazendas de Alto Paraíso e Pacheco apontava: Aqui tinha um campo de altitude bem bonito, disse quando cruzamos um pasto com pouco gado e muito cupinzeiro. Ali tinha uma vereda que foi drenada, mostrou uma baixada onde se erguiam eucaliptos. Mas ao passo que nos distanciávamos da cidade, a vegetação do cerrado se adensava. Chegamos a um ponto em que os pastos deram lugar a um cerradão, com árvores de porte. Estávamos a cerca de 30 quilômetros de Alto Paraíso e tinhamos chegado à entrada do Santuário Ecológico Macaquinho.

As cachoeiras do Macaquinho, como muitas outras atrações de Alto Paraíso, estão dentro de uma propriedade privada. Ela está a aproximadamente 70 quilômetros de distância do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, mas permanece conservada. Dentro da fazenda é possível avistar algumas das espécies típicas do Cerrado e em grande quantidade, como o butiá ( também conhecido com coqueiro-cabeçudo), o candombá e o murici. Mas o quê chama a atenção mesmo são as canelas-de-ema gigantes. Algumas chegam a 3, 5 metros de altura. Elas não são facilmente vistas na região. E Pacheco explica o porquê : muitas são cortadas para servirem de mourão de cerca.

No Santuário Macaquinho além da vegetação preservada, a atração são as cachoeiras no vale do rio do mesmo nome. A caminhada é moderada e em um trajeto de uma hora você se depara com uma série de quedas de perder o fôlego. Primeira se vê o poço Sereno, depois a cachoeira da Caverna, onde uma enorme piscina de água esmeralda adentra uma gruta profunda, e por fim, o salto do Encontro, em que o rio Macaquinho e córrego Fundão se juntam em uma queda elegante (foto ao lado).

Reza a lenda que o dono do Santuário Macaquinho, Fausto Melo, comprou a área de uma família tradicional da região por uma barbada: uma Caravan velha e alguns trocados a mais. Passados 10 anos do grande negócio, chegaram a oferecer 1 milhão de reais a ele, quantia que não o tentou a desfazer-se do paraíso. Melo não confirma as histórias a seu respeito, é um sujeito bastante desconfiado. Quer saber por que tantas perguntas. Na sede da fazenda sentado próximo de um fogão de lenha diz apenas que conquistou aquilo com muita luta. Ele cobra 10 reais de cada pessoa que visita as cachoeiras. A distância e a condição da estrada mantêm os grandes grupos de turistas afastados.

Turismo cambaleante

O caso de Macaquinho não é excessão na Chapada dos Veadeiros, o parque possui apenas dois atrativos a serem visitados. Fora dele, o turista pode passar um mês passeando todos os dias que não esgotará as possibilidades. Grande parte dos locais está bem preservado. Mas não unicamente por trabalho e consciência de seus proprietários e sim por fatores diversos. Muitas fazendas, por exemplo, têm estradas ruins de transitar e não oferecem muito a quem vai visitá-las além de banheiros mal arrumados.

O fato é que o turismo está estagnado em Alto Paraíso, local onde as atrações são todas privadas. O secretário de Turismo da cidade, Marcelo Dharana, não sabe quantificar o número anual de visitantes, mas diz que o feeling é de que o movimento está caindo desde 2005. O problema maior é sazonalidade, as pousadas só conseguem encher seus quartos durante os meses de férias. No começo havia poucos restaurantes e pousadas, mas agora se construiu muito, além da conta, sem estudos de viabilidade econômica, diz Dharana, que há quase quinze anos se mudou do Rio de Janeiro para a Chapada.

Na opinião de Álvaro De Angelis, diretor de meio ambiente da Oca Brasil, organização das mais atuantes na Chapada dos Veadeiros, enquanto o turismo vacila a pobreza da região aumenta, o que no fim das contas afugenta ainda mais o turista. Ele julga que o maior problema da região não é a preservação das fazendas, mas sim a qualidade de vida nos centros urbanos. Há um problema de lixo muito grande, a coleta é irregular. Quem vem para cá para aproveitar não quer ver isso, analisa.

O fraco desempenho do turismo é uma das principais preocupações do prefeito Uiter Gomes de Araújo. Ele mesmo um antigo guia da cidade, acha que ter o turismo ecológico como prioridade na região vai garantir mais impostos. Um dos problemas é diminuir a informalidade de pousadas e guias, que não contribuem com a arrecadação da prefeitura. Apesar de estarmos passando por esse momento difícil, a nossa vocação é o turismo, a nossa administração é totalmente voltada para as questões ambientais, garante. Assim como o prefeito em Alto Paraíso muitos dizem que o ecoturismo é o carro-chefe da economia da região. Infelizmente, um carro ainda um tanto desgovernado.
UC:Parque

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