Invasões e desmatamento são alguns dos problemas. MPE entra com ação civil na Justiça para recuperar patrimônio verde desprezado em BH
Ao lado de uma selva de pedra, um paraíso ecológico desprezado. O Parque Estadual Florestal da Baleia, primeira unidade de conservação ambiental de Belo Horizonte, criada em 1932 na Região Leste, com 102 hectares, não existe apenas no papel, como quer a omissão, e pede socorro. A denuncia é do Ministério Público Estadual (MPE), que investigou a situação de abandono do lugar e entrou com ação civil pública na Justiça contra o estado e a prefeitura, pedindo providências.
Segundo o MPE, incêndios, invasões, desmatamento e poluição das águas de seis nascentes são alguns dos problemas que estão acabando com a área verde, totalmente desprovida de infraestrutura para cumprir com o objetivo para o qual foi criada, ou seja, tornar-se uma das maiores reservas protegidas de vegetação nativa de BH. Somente neste ano, o parque já sofreu pelo menos 15 incêndios. Para complicar, moradores de bairros vizinhos transformaram a mata em bota-fora e depósito de lixo.
O MPE pediu à Justiça a concessão de tutela antecipada para obrigar os responsáveis, sob pena de multa diária de R$ 5 mil, a criar, em 180 dias, um conselho consultivo do parque e elaborar plano de prevenção e combate a incêndio. Também pediu a contratação, em 30 dias, de um gerente e quatro guarda-parques, com veículos e equipamentos. Outro exigência é a implantação, em 180 dias, de guaritas para o controle e fiscalização de acesso à àrea, assim como cercamento e sinalização do perímetro.
As medidas têm que ser definitivas, ressaltam os quatro promotores de Defesa do Meio Ambiente e do Patrimônio Cultural e Turístico que assinam a ação civil pública. Caso os pedidos sejam julgados procedentes pela Justiça, eles pedem prazo de 18 meses para que seja editado o Plano de Manejo da Unidade de Conservação e que seja criado o Jardim Botânico, conforme o Decreto 10.232, de 1932.
A unidade de conservação faz divisa com o Parque das Mangabeiras, o Paredão da Serra do Curral e as matas do Jambreiro e da Baleia. Juntos, formam um corredor ecológico de grande valor ambiental. Somando a área do parque com a da Mata da Baleia são mais de 3 milhões de metros quadrados.
O supervisor de segurança Roseni Antônio Santana, de 40 anos, 19 deles trabalhando no Hospital da Baleia, onde é também brigadista de incêndio, conta que somente neste ano ajudou a apagar mais de 10 focos de fogo na Mata da Baleia e no parque. Ele conta que já viu bichos na mata, como teiú, esquilos, maritacas, cobras, gaviões, tucanos e até um veado-campeiro. "Já vieram estudiosos de vários países." Roseni lembra que o último incêndio foi quarta-feira passada e a parte mais alta do parque foi queimada. Segundo o MPE, são quase 200 espécies de aves na área, entre elas o campainha-azul ou azulão-do-cerrado e a tesourinha-da-mata.
Apesar do descaso, a paisagem do parque é surpreendente. Do alto, aprecia-se BH por ângulos jamais explorados. É possível avistar o Mineirão, a Cidade Administrativa e até a Serra do Rola Moça, no município de Brumadinho.
O coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas, promotor Marcos Paulo de Souza Miranda, conta que o MPE tentou assinar um termo de ajustamento de conduta (TAC) com a Fundação Municipal de Parques e Jardins e Instituto Estadual de Florestas (IEF). "Mas, o empurra-empurra foi imenso e não avançamos." Ele vistoriou o parque e constatou os problemas. "Pude presenciar incêndios e entulho. Não há placas, gerente ou vigilante. Em razão disso, ingressamos com a ação para que o poder público cumpra o seu papel."
ARRUDAS Marcos Paulo ressalta que o Córrego da Baleia, um dos afluentes do Ribeirão Arrudas e do Rio das Velhas, fica dentro do parque. "Se aumentar a qualidade e a quantidade de água do córrego, vamos ter reflexo positivo, sem falar que é uma área belíssima do ponto de vista paisagístico. Há como observar um horizonte diferente daquele tradicionalmente explorado." Além disso, ele lembra que o parque está a cerca de 1 quilômetro dos vestígios do antigo Curral del Rey, onde foi encontrado um muro de pedras recentemente, local usado no passado para recolhimento de impostos. "Aquilo ali é a origem de BH e está abandonado. Lamentável. É uma área que tem condições de ser mais um atrativo turístico imenso para a cidade, além de contribuir com a preservação ambiental."
Para o promotor, o estado de abandono da área é um pequeno retrato da situação das unidades de conservação em Minas. A atuação do MPE não se restringe ao Parque da Baleia, segundo ele. "Temos uma investigação para cada uma das unidades de conservação do estado e constatamos que 70% delas existem apenas no papel e estão sofrendo com incêndios. O papel da unidade de conservação é trabalhar, de maneira preventiva, a conscientização ambiental e o diálogo com a comunidade."
O Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) e a Prefeitura de Belo Horizonte informaram que não foram oficialmente notificados da ação do MPE e que, portanto, não vão se manifestar agora sobre o assunto.
PARA LEMBRAR
Em 1932, o Decreto Estadual 10.232 criou um jardim botânico no lugar onde existe o Parque Estadual da Baleia. O objetivo foi preservar a vegetação e a paisagem da capital mineira. Segundo o MPE, foi a primeira unidade de conservação de BH e uma das primeiras de Minas Gerais e do Brasil. Em 1988, o Decreto Estadual 28.162 criou o Parque Florestal Estadual da Baleia, colocando-o sob a administração do Instituto Estadual de Floresta (IEF). O próprio Plano Diretor Municipal determinou a implantação do parque pela prefeitura, em parceria com o Executivo estadual, segundo o MPE.
PALAVRA DE ESPECIALISTA: Doralice Barros Pereira, professora do Departamento de Geografia da UFMG
"As pressões vêm de todos os lados"
"A iniciativa do Ministério Público é interessante. É algo que a gente sempre está tentando defender, porque as áreas de conservação são criadas e depois não são outorgadas. Realmente, elas ficam só como unidades no papel e a pressões todas vão acontecendo, principalmente do setor imobiliário, para usá-las como reserva para futuros projetos, ou a própria mineração, e também como elemento de possibilidade de agregar valor aos empreendimentos que vão ter, por exemplo, a vista definitiva para a Mata da Baleia, e usá-la como elemento a mais de agregação de venda. A preservação de uma área verde como essa representa muito, não somente para a qualidade de vida da população, como para a biodiversidade e sociodiversidade, pois há muitas pessoas que usam aquela mata para pegar plantas medicinais e outros recursos. Há ainda a preservação da qualidade do ar e da água. Estamos praticamente acabando com todos os espaços verdes de BH. A Mata da Baleia, o câmpus da UFMG, o Horto Florestal e a Granja Werneck são as maiores extensões de áreas verdes da cidade, localizadas em pontos estratégicos".
Biribiri pede socorro
O Instituto Estadual de Florestas (IEF) e o estado terão que tomar medidas de preservação do Parque Estadual do Biribiri, em Diamantina, no Vale do Jequitinhonha. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) acatou o recurso do Ministério Público Estadual (MPE), que alegou degradação da reserva ecológica. Biribiri é uma unidade de conservação criada em 1998, às margens da área urbana de Diamantina, com a finalidade de proteger a biodiversidade, nascentes e córregos.
O parque tem ainda vários sítios arqueológicos, com painéis e pinturas rupestres. O MPE abriu investigação depois de receber denúncias de degradação. As apurações apontaram que o local estava sendo alvo de vandalismo, extração de lenha, garimpo, pesca e caça, devido a ausência de fiscalização.
O juiz analisou o pedido e determinou a implantação de infraestrutura adequada ao parque, incluindo equipamentos de comunicação, corpo técnico e guardas, veículos, sinalização educativa e brigada de incêndio. O TJMG decidiu ainda que o estado e o IEF devem tomar providências para a regularização fundiária e para a atualização do Plano de Manejo da área, que deve ser integrado à vida econômica e social das comunidades que a rodeiam.
UNIVERSIDADE Depois de receber recomendação do Ministério Público Federal (MPF), a Universidade dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), em Diamantina, definiu intervenções de caráter imediato e paliativo para que os impactos causados no Parque Estadual do Biribiri sejam diminuídos ao máximo, devido a ocorrência de processos erosivos no terreno da instituição de ensino.
De acordo com o pró-reitor de Administração da UFVJM, Paulo César de Resende Andrade, será retirada a areia alojada entre o asfalto e a cerca do câmpus e o plantio de vegetação adequada, com adubação e assistência técnica. Além disso, o terreno será nivelado e uma camada de grama será plantada para melhorar absorção de água dentro da universidade.
http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2014/10/09/interna_gerais,577826/parque-estadual-florestal-da-baleia-sofre-com-o-abandono.shtml
UC:Parque
Unidades de Conservação relacionadas
- UC Baleia
- UC Biribiri
As notícias publicadas neste site são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.