Legislação catarinense permitiu ocupação e utilização de áreas ambientais de maneira predatória, causando prejuízos irreversíveis à região e à população. PGR aponta inclusive prejuízos ao abastecimento de água potável em Florianópolis e municípios vizinhos
Seguindo a função institucional do Ministério Público de proteger o meio ambiente, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ofereceu ação contra uma lei de Santa Catarina (SC) que redefiniu os limites do Parque Estadual Serra do Tabuleiro, uma das mais importantes unidades de conservação ambiental do Estado. Segundo o PGR, a legislação permitiu a ocupação e a utilização de áreas ambientais de maneira predatória, causando prejuízos irreversíveis à região e à população.
A ação direta de inconstitucionalidade (Adi) 5.385, apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF), questiona artigos (4o, caput e II, e 12 a 15) da Lei 14.661/2009, de SC, que reavaliou e definiu os limites do Parque, resultando em um mosaico de unidades de conservação. Segundo Janot, o retalhamento da unidade de preservação integral para a criação de APAs, além de violar a Constituição Federal, não respeitou a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, que exige prévia consulta pública.
Com a lei, a área do parque foi reduzida de 87.405 para 84.130 hectares, com áreas de proteção ambiental (APAs) totalizando 7.615 hectares. O procurador-geral alerta que a proteção oferecida pelas APAs é mais branda, pois admite ocupação humana, compõe-se de terras públicas e particulares, permite a exploração de determinada atividade, entre outros. Já há informações, inclusive, da realização de loteamentos irregulares, exploração de atividades de mineração, rizicultura e instalação de zona industrial.
"A pretexto de reavaliar o Parque Estadual e criar um mosaico de unidades de conservação em seus limites, na verdade cuidou apenas de descaracterizá-lo, retalhando-o em unidades melhores, muito menos protetivas dessa riqueza ambiental valiosíssima", avalia Janot. Segundo o PGR, "a lei verdadeiramente nega os compromissos assumidos pelo Brasil com a proteção dos recursos naturais e da biodiversidade, colocando em risco importantes ecossistemas de seu território."
Retrocesso ambiental - De acordo com a ação, a legislação catarinense fere o princípio implícito da Constituição que veda o retrocesso em questões ambientais, ou seja, que proíbe alterações legislativas e administrativas voltadas a flexibilizar situações já consolidadas de proteção do meio ambiente. Conforme Janot, "as normas atacadas promoveram significativa redução do regime de proteção dos ecossistemas presentes no Estado de Santa Catarina."
A Adi5.385 aponta que há um "grave retrocesso de proteção ecológica e debilitação das áreas de Mata Atlântica existentes no parque." "Em particular, a recategorização da região da Vargem do Braço, em que se situa o manancial de água de Pilões, muito provavelmente resultará, com o tempo, em enormes e graves prejuízos ao abastecimento de água potável em Florianópolis e municípios vizinhos", alerta.
Parque - Criado em 1975, o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro é uma das principais unidades de conservação ambiental de Santa Catarina, sendo a maior em extensão. Abrange áreas dos municípios de Florianópolis, Palhoça, Santo Amaro da Imperatriz, Águas Mornas, São Bonifácio, São Martinho, Imaruí, Garopaba e Paulo Lopes.
A maior parte do Parque está coberta pela Mata Atlântica, incluindo regiões litorâneas e de serra, com os ecossistemas de Florestas Atlântica e de Araucária, Campos de Altitude, Restinga e Manguezal. A área garante proteção integral de espécies da flora e da fauna e de aspectos paisagísticos, ecológicos e culturais, contendo a principal fonte de água potável da cidade de Florianópolis e dos municípios vizinhos.
Histórico - A lei estadual 14.661/2009 surgiu após o chamado Movimento pela Recategorização, composto por proprietários de terras, negócios, benfeitorias e atividades de exploração direta, muitos deles réus em ações penais por crimes ambientais e ações civis públicas de responsabilização por danos ao meio ambiente.
Em 2006, a Assembleia Legislativa de Santa Catarina instituiu o Fórum Parlamentar Estadual da Serra do Tabuleiro, integrado por onze deputados estaduais. Com a finalidade de sistematizar propostas e solucionar problemas, foi criado um Grupo de Trabalho, formado por representantes do "Movimento pela Recategorização", da Fundação do Meio Ambiente do Estado de Santa Catarina (FATMA), pela Procuradoria-Geral do Estado e pela Assembleia Legislativa, além de entidades ecológicas.
Após estudos técnicos, com grande participação das comunidades atingidas, foi dado início a um encaminhamento técnico e político do problema, com isenção e rigor científico, firmando o entendimento da permanência do parque na mesma categoria de unidade de conservação de proteção integral, o que inviabilizaria a ideia de recategorização.
Buscando um caminho de natureza estritamente política, porém, o Movimento pela Recategorização encomendou estudos sem rigor científico, destinados a atender interesses particulares. O trabalho foi apresentado à Secretaria de Estado do Meio Ambiente e ao Governo do Estado, que encaminharam em 2008, sem solicitar parecer da FATMA, o projeto que culminou na Lei questionada pelo procurador-geral.
O procurador-geral de Justiça do Estado de Santa Catarina também ajuizou ação direta de inconstitucionalidade por ofensa à Constituição Estadual, que foi julgada improcedente pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça catarinense. Posteriormente, foi apresentado o recurso extraordinário 700.872 ao STF, cujo seguimento foi negado pela ministra Rosa Weber.
Veja a íntegra da ADI.
http://noticias.pgr.mpf.mp.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_meio-ambiente-e-patrimonio-cultural/pgr-redefinicao-dos-limites-do-parque-estadual-serra-do-tabuleiro-sc-e-inconstitucional
UC:Parque
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