O ano termina como começou para os Pataxó no sul da Bahia: sob ameaça. Uma reintegração de posse, expedida no dia 23 de novembro último, corre o risco de ser efetivada esta semana, às vésperas do Natal e da temporada de festas, quando a região de Cumuruxatiba se prepara para receber turistas de todo o mundo.
A tensão aumentou há quatro dias, quando a comunidade da Aldeia Kaí sofreu uma tentativa de expulsão por funcionários de um empreendimento turístico, que deseja realizar uma festa de final de ano nas proximidades da praia de Ponta do Moreira. Acontece que a área para a qual está previsto o evento Reveillon MAREH NYE 2017 faz parte da Aldeia Kaí e está dentro dos limites da TI Comexatibá (Cahy-Pequi), delimitada em meados de 2015 pela Funai e palco de violentos ataques no começo de 2016.
"Quando nós chegamos ao local, já estava tudo cercado", conta Xawã Pataxó. A comunidade foi informada sobre a reintegração por um dos funcionários do empreendimento, quando tratores e materiais de construção já estavam no local, destruindo a vegetação de restinga e um grande viveiro de ervas medicinais, nas proximidades de área de preservação mantida pelos estudantes da Escola Indígena Kijetxawê Zabelê. "Vocês vão ver se vocês não vão sair daqui", ameaçou um dos funcionários, que, segundo Xawã, alegava ter autorização do município de Prado e um contrato com o proprietário da área.
Xawã conta que os Pataxó fizeram os funcionários se retirarem do local e elaboraram uma carta-denúncia enviada no início desta semana notificando o Ministério Público Federal (MPF), a Funai, o Iphan, a AGU e outros órgãos. Segundo Xawã Pataxó, as polícias Federal e Militar do Estado da Bahia já foram oficiadas e a comunidade teme que a ação seja executada em meio ao recesso de final de ano.
Retrocessos à vista
Tanto os Pataxó quanto a Funai desconheciam a decisão do juiz federal Guilherme Bacelar, de Teixeira de Freitas (BA), que deferiu a liminar de reintegração das fazendas Porta da Magia e Aldeia da Lua. Movida pela família Lessa de Moraes, a ação que originou a reintegração é uma das dez contestações judiciais de particulares contra a TI Comexatiba. Leia a decisão.
Xawã Pataxó conta que a ação da família Lessa de Moraes não tramitava desde setembro. Para ele, o fato de a liminar ter sido concedida há pouco menos de 30 dias não é acaso. Xawã lembra que o mesmo juiz que determinou a reintegração já havia multado Lucas Lessa de Moraes por ocupar irregularmente lotes no Projeto de Assentamento Cumuruxatiba, sobreposto à TI Comexatiba.
A perita em antropologia do MPF na Bahia, Sheila Brasileiro, explica que o órgão já havia solicitado a realização de uma perícia judicial na área, mas o juiz federal negou o pedido. "Esse juiz tem sistematicamente dado decisões desfavoráveis aos índios", revela Sheila, demonstrando preocupação com uma interpretação sustentada por magistrados da região de que as áreas só poderiam ser consideradas indígenas depois de declaradas pelo Ministério da Justiça.
A perita também chama a atenção para o fato de o processo de demarcação da TI Comexatiba ter sido pauta de um requerimento ainda não aprovado na Comissão Parlamentar de Inquérito da Funai e do Incra, protocolado pelo deputado federal João Carlos Bacelar (PR/BA) neste mês de dezembro. O texto do requerimento cita os supostos impactos da demarcação sobre a economia de Cumuruxatiba e a sobreposição da Terra Indígena com o Parque Nacional do Descobrimento. A sobreposição também é motivo de disputa judicial.
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PIB:Leste
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