Em um ano, a premiada rede Origens Brasil, da Amazônia, cresce 69% e movimenta mais de R$ 2,3 milhões em produtos da floresta
4 de agosto de 2021 Mônica Nunes
Manter a floresta em pé é e sempre será um bom negócio. Quando a pandemia do novo coronavirus chegou, impondo distâncias e retraindo o consumo, tornou ainda mais vulneráveis as comunidades tradicionais e os povos indígenas, que vivem na floresta e dependem dela para sobrevier.
Mas, ao contrário do que se poderia prever, o interesse pela produção desses populações, no âmbito da rede Origens Brasil, que atua na Amazônia desde 2016, cresceu de maneira considerável.
É o que indica o relatório 2020 lançado em junho por essa rede, que registrou o aumento de 69% em relação à adesão de empresas-membro - de 16 para 28 -, que compram de 1882 produtores, com potencial de beneficiar 12.774 representantes de 43 povos indígenas e populações tradicionais.
Em um ano, foram comercializados R$ 2.374.480,18 milhões em produtos da floresta, revelando que estes são negócios resilientes e sustentáveis, capazes de superar turbulências econômicas.
Entre os novos membros estão a Cervejaria Colorado, a marca Osklen, a Feira Rosenbaum, Bemglô, Cocar & Co, Wickbold, Mercur, Bossapack, Manioca e Pão de Açúcar.
"Os tempos que vivemos mostram a urgência de aumentar a resiliência dos territórios e dos seres humanos que neles vivem", diz Isabel Garcia, conselheira da Origens Brasil e gerente do Imaflora. "O sentido maior de uma rede que articula as pessoas que vivem na floresta e da floresta em pé é precisamente fortalecer as relações e promover conexões que levem à prosperidade, à verdadeira prosperidade. A Rede Origens Brasil tem proporcionado o ambiente para que este objetivo seja atingido".
Desde o início de sua criação, em 2016, a rede já apoiou a venda de mais de R$ 10 milhões de reais em produtos que representam mais de mil toneladas e contribuem para a proteção de 52 milhões de hectares de floresta em pé - o equivalente ao tamanho da Espanha.
A proteína do pirarucu, a castanha-do-brasil, a borracha, o cumaru (a baunilha da Amazônia), o babaçu, a cerveja amazônica e a granola de tapioca são os principais produtos comercializados. E são os produtos relacionados à alimentação que representam a principal pauta de comércio ético e transparente da Origens Brasil.
Produtos que impulsionaram os negócios em 2020
Proteína de pirarucu
O pirarucu é o maior peixe de escamas de água doce do mundo - pode chegar a pesar 200 quilos e medir até 4 metros de comprimento - e, graças à rede Origens Brasil sua presença em rios e lagos do Território Solimões aumentou cerca de 400% e sua proteína foi um produtos que mais impulsionaram os negócios em 2020.
A rede apoia iniciativas de manejo sustentável desta espécie símbolo da Amazônia, contribuindo para a conservação da diversidade socioambiental e a valorização das comunidades tradicionais. E tem o Instituto Mamirauá como parceiro desse programa de manejo participativo.
A produção de proteína do pirarucu é realizada pelas populações ribeirinhas das Reservas de Desenvolvimento Sustentável Amanã e Mamirauá, no Solimões. A comercialização, agora, está a cargo da Cocar & Co, que, em 2020, comprou 11.315,2 kg de pirarucu manejado.
É esta relação comercial direta e ética que contribui para garantir a manutenção de mais de 5,5 milhões de hectares de floresta em pé.
Baunilha da Amazônia
A produção de cumaru é realizada por 14 instituições que apoiam dez áreas protegidas quilombolas e extrativistas no Território Calha Norte da rede Origens Brasil, no Pará.
Suas sementes têm perfume muito semelhante ao da baunilha, da amêndoa, do cravo e da canela, por isso, é muito utilizado na produção de aromas e fragrâncias.
Primeiro cogumelo nativo
Outra novidade da rede é o cogumelo do povo Yanomami - o primeiro nativo da floresta amazônica a ser comercializado no mercado brasileiro. Fruto de parcerias com os povos indígenas da bacia do Rio Negro, era pouco conhecido de grande parte do país, até ser integrado a rede por intermédio do ISA.
"Essas parcerias comerciais e institucionais têm sido importantes para darmos visibilidade ao nosso conhecimento, a nossa maneira de ser, a nossa forma de pensar", salienta André Baniwa, da Organização Indígena da Bacia do Içana (OIBI), que também produz o cogumelo.
Gênero e cultura
Outro destaque do relatório da rede Origens Brasil é a promoção da paridade de gênero nas relações comerciais com os povos da floresta. Ou seja, a igualdade.
Mais de metade (55%) das iniciativas de comércio da rede, no último ano, se deve às mulheres do Território Xingu. No Rio Negro, elas também dominam as iniciativas: 54%.X 46% dos homens.
Tais atividades também contribuem para a conservação da Amazônia e de seu patrimônio cultural.
"É da nossa cultura cuidar da floresta. Isso vem dos nossos antepassados que já sabiam que a floresta é nosso bem mais precioso. Ela é nossa farmácia, nosso mercado, o nosso sustento. O extrativismo dos produtos da floresta é parte da cultura do meu povo quilombola", diz Maria Daiana, moradora do Último Quilombo, em Oriximiná, Pará.
Em prol da floresta em pé
A Origens Brasil surgiu da iniciativa de produtores da floresta e do Imaflora - Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola e do ISA - Instituto Socioambiental com o objetivo de mobilizar organizações que atuam em territórios amazônicos, comunidades e empresas para viabilizar negócios em prol da floresta em pé com garantia de origem, rastreabilidade, transparência e promovendo comércio ético.
A rede conecta empresas a cadeias produtivas sustentáveis em áreas prioritárias de conservação na Amazônia, gerando valor para os povos indígenas e populações tradicionais que vivem da floresta - "os verdadeiros guardiões do nosso patrimônio socioambiental", destaca a rede em seu site.
"Esse é um caminho para promover a segurança da origem socioambiental dos produtos. Nesse momento, somos um ato de resistência para permitir a existência", destaca Luiz Brasi, coordenador da Origens Brasil/Imaflora.
Em 2019, a rede recebeu o Prêmio Internacional de Inovação para a Alimentação e Agricultura Sustentáveis da Organização das Nações Unidas (ONU), como contamos aqui, no Conexão Planeta.
Conexões
Para o enfrentamento do novo coronavirus na região, foi imprescindível contar com a conexão entre os povos da floresta e as empresas, que resultou em iniciativas importantes de apoio.
Um exemplo foi a captação para a ação emergencial contra a covid-19, que beneficiou mais de 2 mil famílias na região da Terra do Meio (Xingu) e Oriximiná, (Calha Norte), ambos no Pará.
Com a pandemia, as formas de engajamento da rede foram adaptadas. O encontro anual, de 2020, por exemplo, foi realizado em formato virtual, durante dois dias. Cerca de 150 pessoas debateram e fizeram reflexões sobre o contexto da Amazônia e seu impacto para os povos e negócios da floresta, a comunicação em rede, o mercado ético. Também foram definidas as ações prioritárias para este ano como a expansão de atuação da rede para o quinto território.
"É muito bom poder integrar um grupo de mais de cem pessoas que comungam com a visão da importância das florestas e das comunidades tradicionais nesse manejo", declarou Adriana Ramos, assessora do ISA, durante o encontro.
Para Patricia Gomes, gestora da Origens Brasil e secretária executiva adjunta do Imaflora, "2020 foi um ano que impôs distâncias físicas em função de uma crise sanitária global - e que expôs povos indígenas e populações tradicionais a condições de vulnerabilidade ainda maiores. Fomos desafiados a buscar novas formas para continuarmos próximos e atuar pela conservação da Amazônia e pela valorização de seus povos".
https://conexaoplaneta.com.br/blog/em-um-ano-a-premiada-rede-origens-brasil-da-amazonia-cresce-69-e-movimenta-mais-de-r-23-milhoes-em-produtos-da-floresta/#fechar
Amazônia:Biodiversidade
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