Época, p. 86-87 - 08/08/2005
Parques de papel
Pesquisa inédita revela que já foi desmatado o equivalente ao Estado de Sergipe em áreas protegidas. Rondônia tem a pior situação
Luciana Vicária
A maior floresta tropical do mundo ganhou 12 milhões de hectares em áreas protegidas nos últimos dois anos. Mas a prática mostra que criar parques e reservas não contém a ação dos fazendeiros que desmatam, revela um estudo inédito do instituto Imazon, coordenado por Beatriz Ribeiro, que comparou digitalmente imagens de satélite com as áreas delimitadas das reservas. Só em Rondônia, o Estado que mais destrói áreas protegidas (ilustração ao lado), três reservas já perderam mais de 60% da cobertura vegetal.
As unidades de conservação ainda são o que há de mais eficaz para deter a devastação. Desde a década de 70, a Amazônia perdeu 12% de sua floresta. Mas o avanço nas áreas protegidas foi de 1,5%. Essas áreas protegidas são o último recurso para salvar a floresta. E a pressão sobre elas é cada vez maior.
Nem a multa por crimes ambientais tem sido capaz de conter a ação dos madeireiros. O lucro obtido com a derrubada da madeira é tamanho que supera o valor pago às autoridades - quantia que pode ser reduzida a até 10% de seu valor original e paga dois anos após a notificação. Há ainda exploradores que agem livremente nas florestas porque falta fiscalização. Das 14 áreas protegidas ao longo da BR-163, que liga Cuiabá a Santarém, oito não têm fiscais do Ibama.
"Postos de fiscalização, pessoal habilitado e vigilância não resolvem o problema", diz José Maria da Silva, da ONG Conservação Internacional. O Programa Áreas Protegidas da Amazônia (Arpa), do governo federal, é uma tentativa de investir mais no setor. "Existe uma limitação financeira muito grande", admite João Paulo Capobianco, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente. "A floresta só se conserva se for rentável de pé e gerar renda para sua própria preservação", completa.
Estima-se que o custo anual para a manutenção de uma unidade de conservação da Amazônia seja de US$ 200 mil - dinheiro que o governo não tem como tirar de seu orçamento. Poderia sair do turismo, mas ainda não existe na Amazônia um único parque nacional em que se possa entrar legalmente como visitante. "Há milhares de pessoas no mundo que gostariam de pagar para conhecê-los", diz Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da Terra Amazônia Brasileira. Na Tanzânia, os parques nacionais são a maior fonte de recursos do país.
Em Estados onde a floresta já deu sinais de esgotamento fora das unidades de conservação, como Rondônia, cria-se uma pressão ainda maior sobre as 43 áreas protegidas. O levantamento feito a partir de imagens de satélite pelo Imazon mostra que três áreas do Estado já perderam mais de 60% das florestas. "A derrubada de árvores está controlada", rebate Nilo Magalhães, gerente das Unidades de Conservação de Rondônia. De acordo com dados oficiais do Estado, o desmatamento na Reserva Extrativista de Curralinho seria de 2,62%, contra 64% do Imazon.
A situação dessas áreas pode ser ainda pior. Os satélites não captam a extração isolada de madeira nem a caça predatória. Além do impacto ecológico, a devastação cria problemas sociais ao deslocar comunidades para áreas urbanas. Um raro exemplo positivo é a Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá, de 1,124 milhão de hectares, no Amazonas. Lá a população tem regras de uso para a pesca e a retirada da madeira obedece a um plano de manejo. A destruição da floresta tende a zero.
Época, 08/08/2005, p. 86-87
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG71303-6014,00-PARQUES+DE+PAPEL.html
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