OESP, Vida, p. A16 - 18/05/2006
A cidade do futuro no Planalto Central
Marcos Sá Correa
A Cidade de Pedra, em Goiás, é uma das paisagens mais antigas do Brasil. Mas chegou há pouco aos roteiros turísticos do Brasil. Por isso, o guia Luiz Evandro Triers, um dos 20 moradores credenciados pela Associação dos Condutores de Visitantes de Pirenópolis, avisou esta semana, ao botar o pé na trilha, que estava pisando pela terceira vez este ano naquele labirinto de rocha faiscante, esculpida pelo tempo no terreno pré-cambriano.
Na volta, como se fosse para mostrar que não estava exagerando, perdeu o caminho para o carro.
Quando não está em campo, mostrando o monumento natural que a prefeitura incorporou às atrações de Pirenópolis, Triers ganha a vida como pedreiro. Ainda bem, porque ganha R$ 50 por passeio e a freguesia, além de rala, é disputada entre os guias locais.
Pirenópolis fica a pouco mais de 40 quilômetros, por estrada de terra, costeando o Parque Estadual da Serra dos Pireneus, com trechos que parecem feitos para anúncio de carro 4x4. Ela tem pouco mais de 21 mil habitantes. Mas Brasília está a duas horas de viagem. E o centro histórico da cidade transborda de forasteiros nos fins de semana, quando a população dobra e as 300 pousadas descontam a pasmaceira dos dias úteis.
Em outras palavras, a Cidade de Pedra tem tudo para pegar. Só foi descoberta pelo resto do País no ano passado, quando a TV Globo deu o empurrão que faltava a uma campanha municipal para transformá-la em unidade de conservação. Esperou por isso milhões de anos, enquanto a erosão roía suas rochas, formando torres de arenito e anfiteatros naturais, cravejados de mica e quartzo, que brilham sob o sol ofuscante do planalto goiano.
O cenário lembra paisagens brasileiras nacionalmente famosas, como a de Vila Velha, no Paraná, ou das Sete Cidades da serra da Capivara, no Piauí. "Mas é mais impressionante, a melhor que conheço", diz o ambientalista Marc Douroujeanni.
RESERVA MODELO
Douroujeanni criou a divisão de proteção do meio ambiente no Banco Interamericano de Desenvolvimento, preside no Peru a fundação Pro-Naturaleza e mora em Pirenópolis há mais de quatro anos com a mulher, a ambientalista Maria Tereza Pádua, madrinha da primeira Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) no município, o Santuário de Vida Silvestre Vagafogo.
Em 1987, o Vagafogo não passava de um sítio de 44 hectares. Seu dono, Evandro Egler, vendia ovos caipiras e queijos artesanais em Brasília. Hoje a propriedade recebe 14 mil visitantes por ano, a R$ 9 por cabeça. E Egler é secretário de Turismo de Pirenópolis.
Tudo porque na ocasião Maria Tereza acabava de deixar o governo, depois de fazer, entre outras proezas pioneiras, 8 milhões de hectares de unidades de conservação na Amazônia, entre outras novidades, e presidia a Funatura, uma fundação dedicada a salvar as últimas sobras do Cerrado.
Por sua mão, o Vagafogo virou modelo de reserva particular no País. Só ali em Pirenópolis inspirou outras seis RPPNs, inclusive as que dão ao Rio das Almas o raro privilégio de atravessar a cidade entre matas ciliares, em vez de se esgueirar, como é o costume nacional, pelo fundo das casas que se penduram em seu barranco.
O resultado é que, 46 anos depois da criação de Brasília, a velha Pirenópolis tornou-se um exemplo do que a civilização brasileira deveria fazer pelo futuro no interior do País.
Marcos Sá Correa, Jornalista e editor do site O Eco (www.oeco.com.br)
OESP, 18/05/2006, Vida, p. A16
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