A Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (de Direito Público) manteve nula a Lei Estadual n 8616/2006, que previa a redução da área total do Parque Estadual do Cristalino, localizado no extremo Norte do Estado, dos atuais 184,9 mil hectares para 158,3 mil hectares. Os julgadores ratificaram o entendimento do Juízo da Vara Especializada de Meio Ambiente, segundo o qual a referida lei foi aprovada pelo Legislativo Estadual e sancionada pelo Poder Executivo sem o necessário respaldo de estudos técnicos e avaliações biológicas. O Parque do Cristalino é considerado uma das mais importantes reservas da biodiversidade da região amazônica.
De acordo com os autos do processo, o Estado enviou, em 2006, um projeto de lei para a Assembléia Legislativa de Mato Grosso cuja proposta era a de unificar as áreas dos Parques Cristalino I e II, localizadas nas unidades de conservação ambiental entre os municípios de Alta Floresta e Novo Mundo, localizados, respectivamente, a 803km e 785km ao norte de Cuiabá. Tal projeto foi precedido de estudos técnicos, impostos pela Lei Complementar n 232/2005. Ao longo do trâmite da demanda na Casa de Leis, um grupo de deputados estaduais apresentou uma emenda ao projeto inicial, pleiteando a diminuição da área do parque com base na alegada necessidade de fornecer porções de terra para pequenos produtores rurais da região.
O esboço inicial enviado pelo Executivo foi alterado por um projeto substitutivo da Assembléia e aprovado sem ressalvas pelo parlamento, embora recebesse veto integral do governador do Estado. Como resultado, elaborou-se a Lei n 8616/2006, sancionada pelo Legislativo. A sua aplicação foi contestada e anulada pela Justiça de Primeiro Grau. Por meio da Apelação n 90178/2009, a Assembléia solicitou a reforma da decisão, argumentando que não caberia ao Judiciário inferir sobre sua atividade, sob pena de violar o princípio da separação e harmonia dos Poderes. Nesse sentido, defendeu que o ato administrativo revestiu-se dos requisitos da oportunidade e conveniência do Legislativo, além de não contrariar as regras formais.
A relatora do recurso, desembargadora Clarice Claudino da Silva, observou em seu voto que a Administração Pública, enquanto atividade estatal voltada para a gestão de interesses difusos e coletivos, deve ser controlada tanto por si própria como pelo Poder Judiciário, cujo objetivo é evitar a ocorrência de arbitrariedades, ilegalidades e lesões a direitos individuais. Sendo assim, atos administrativos nulos, como a referida lei, ficam sujeitos a invalidação pelo Judiciário sem que haja invasão de Poderes. A desembargadora ressaltou que, tanto para a unificação, como para a redução de unidades de conservação ambiental já demarcadas por meio de ato normativo, impõe-se a definição, mediante estudos técnicos, dos seus potenciais naturais e das restrições de uso e ocupação. No caso, os estudos técnicos necessários não foram feitos, o que justificaria a anulação da Lei n 8616/2006 por vício de ordem formal.
De acordo com a relatora, "esqueceu-se do requisito formal mais importante, que é o estudo técnico para a pretensa redução dos limites geográficos, pois as áreas protegidas, em regra, são dotadas de atributos que precisam ser conservados para o bem-estar das populações que se situam nos seus limites, além de assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais", enfatizou. Acompanharam esse posicionamento os desembargadores José Silvério Gomes (revisor) e Márcio Vidal (vogal).
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