Estado desapropria fazenda em Manga e não paga donos

O Tempo - www.otempo.com.br - 02/08/2010
Em fevereiro de 2009, a Fazenda Ressaca, em Manga, Norte de Minas Gerais, foi desapropriada pelo governo, pela segunda vez. Sua área remanescente, de 5.542 hectares (ha)- o equivalente a 6.717,5 campos de futebol do tamanho do Mineirão-, passou a fazer parte do Parque Estadual da Mata Seca, por meio do Decreto 45.043. Na época, o parque foi ampliado de 10.281 ha para 15.360 ha. Hoje, um ano e meio depois, os proprietários ainda não receberam nenhum centavo dessa segunda desapropriação.

Segundo o advogado dos donos, Flávio Filizola, o Instituto Estadual de Florestas (IEF), que fez a desapropriação, já foi procurado várias vezes, sem sucesso, na tentativa de fechar um acordo para o pagamento. "Desapropriar com um fim público é direito do Estado, desde que haja indenização prévia, o que é garantido pelo inciso XXIV do artigo 5 da Constituição Federal. Mas isso que o governo fez foi um confisco, pegou a terra e não pagou", denuncia Filizola, que se prepara para cobrar na Justiça.

Segundo o advogado, a fazenda vale hoje cerca de R$ 8,3 milhões, considerando que o preço de mercado do hectare na região de Manga é de, aproximadamente, R$ 1.500.

Pelos cálculos de Filizola, a indenização teria que ser de, no mínimo, R$ 4,7 milhões. A conta considera o valor de R$ 850 pago por cada ha da mesma fazenda, que já havia tido uma área de 1.197 ha desapropriada em 2007, para ampliação desse mesmo parque. "Esse valor, que já está defasado, foi calculado por peritos do próprio IEF na ocasião da primeira desapropriação, então não há como contestar", explica. Filizola lembra que, na época, o governo demorou um ano para pagar, mas honrou a indenização.

O artigo 6 do Decreto 45.043 diz que caberia à Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag) disponibilizar ao IEF os recursos necessários para a desapropriação. Entretanto, Filizola alega que o governo fez o processo do "fim para o começo". "Primeiro, o IEF deveria verificar se havia recursos disponíveis para fazer a indenização, para depois desapropriar o terreno. Mas eles desapropriaram primeiro e o pagamento ficou para depois, só que, até agora, nada", reclama.

Procurado pela reportagem, o governo, por meio da assessoria de imprensa, explicou que, de acordo com a legislação federal (Decreto Federal 3.365, que normatiza a desapropriação por utilidade pública), o Estado terá cinco anos para indenizar o proprietário da área desapropriada, a partir da data de publicação do decreto estadual ( fevereiro de 2009). Os valores serão definidos na época da quitação.

A advogada Mônia Lasmar do escritório Décio Freire, explica que o decreto é o meio para declarar ao expropriante o interesse na desapropriação. Entretanto, para que o Poder Público seja dono do bem, primeiro ele precisa efetuar a avaliação e a indenização. "O processo inteiro tem o prazo de cinco anos, mas até lá, o Estado não é dono", explica.

Sobre o parque
Quando foi criado - O Parque Estadual da Mata Seca foi criado pelo Decreto 41.479 de 20 de dezembro de 2000

Ampliação
Segundo certidão do IEF, em março de 2007 foi lavrada a escritura de uma desapropriação de 1.197 ha da Fazenda Ressaca, para ampliar o parque. Em fevereiro de 2009, a área do parque foi ampliada de novo, para 15.360 ha, com desapropriação do restante da fazenda

Preservação
A unidade de conservação preserva uma cobertura vegetal com espécies como barba de mão, aroeira, pau- preto e animais como onças preta e parda

Restrição

Proprietários foram multados - Desde que o Decreto Estadual 45.043 foi publicado, no dia 13 de fevereiro de 2009, os proprietários da fazenda Ressaca, em Manga, Norte de Minas Gerais, não podem exercer nenhuma atividade na fazenda. No dia 8 de junho deste ano, a propriedade recebeu uma multa de R$ 110 mil do Instituto Estadual de Florestas (IEF), pela presença de gado no local, sob alegação de dano indireto em unidade de conservação.

Na avaliação do advogado dos proprietários, Flávio Filizola, a multa é uma incoerência e prova que o Estado, mesmo não tendo pagado a indenização, se considera o dono das terras. "Ao aplicar uma multa, o Estado reconhece que considera a desapropriação consumada, mas isso não poderia ser feito, até que todo o processo fosse concluído, o que inclui o pagamento", afirma.

Pela lei, o Poder Público, ao iniciar uma desapropriação, já tem que ter feito sua avaliação do bem. Agora, o advogado vai à Justiça tentar receber os valores devidos. Ele afirma que vai solicitar que o juiz mande avaliar o terreno. "Quando o valor for determinado, o juiz vai fixar um prazo para o Estado pagar. Se a indenização não for feita dentro do período estipulado, o decreto da desapropriação pode cair", destaca.

Segundo Filizola, como o objetivo da desapropriação é a ampliação de um parque, fica mais difícil negociar. "Se o Estado dependesse de desapropriar a fazenda para construir algo, teria interesse em pagar, já que não poderia seguir com a obra sem concluir a desapropriação. Mas como o parque é um ato já consumado por si só, fica mais difícil", afirma.

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