Esgoto em rio ameaça área de proteção ambiental

O Globo, Rio, p. 26 - 07/06/2015
Esgoto em rio ameaça área de proteção ambiental
Degradado, Guaxindiba passa por APA de Guapimirim, que abriga o maior manguezal do estado

Uma linha de esgoto desenha o curso do rio, e o mau cheiro domina o ambiente cercado de verde. A navegação segue por uma superfície escura e com aparência viscosa. As águas sujas são do Rio Guaxindiba, que, antes de desembocar na Baía de Guanabara, ameaça a fauna da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim e o Rio Caceribu, um dos poucos que ainda vencem a poluição na região. Em uma tentativa de evitar danos maiores, um projeto em estudo pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) - órgão federal responsável pela gestão da área - pretende criar uma barragem no canal de 200 metros que liga os dois rios e evitar que a contaminação do Guaxindiba se espalhe também pelo Caceribu.
Com 14 mil hectares, a APA de Guapimirim tem seis mil hectares de manguezal, a maior área do estado com este tipo de vegetação. Aves como colereiro, martim-pescador, garçaazul, e espécies como capivara e jacaré-do-papo-amarelo são típicas da região.
- A flora até suporta (a poluição), mas o grande problema é com a fauna. O lançamento de esgoto vai dilapidando as espécies mais sensíveis - analisa o biólogo Mario Moscatelli. - Quando comecei a sobrevoar a baía, há 20 anos, o Guaxindiba ainda era limpo. Hoje, ele se soma aos demais rios podres da região. O agravante é que ele passa dentro da APA de Guapimirim, que representa a última fatia preservada do litoral da baía. Ele passa em exuberantes manguezais, mas virou valão de esgoto e lixo.
De acordo com o biólogo Maurício Muniz, gestor da APA, a presença da vegetação é fundamental para impedir um prejuízo ambiental ainda maior.
- O Guaxindiba penetra bastante no mangue, que funciona como se fosse um filtro natural e ajuda a tratar a água - explica.
O canal que possibilita a troca de água entre os rios Guaxindiba e Caceribu é artificial e foi aberto para facilitar a navegação de equipamentos de uma fábrica de cimento que havia na região. Sem a atividade industrial, técnicos do ICMBio e pescadores da área defendem a interrupção do fluxo como forma de preservação. Já que a poluição no Guaxindiba só avança, o objetivo é, ao menos, impedir que o Caceribu tenha o mesmo destino.
- Nossa ideia é desenvolver esse projeto (da barragem) como parte da compensação ambiental de alguma empresa que já tenha causado prejuízos à baía - explica Muniz. - O Guaxindiba é um rio podre, que está levando todo o esgoto de São Gonçalo para a baía. Ele foi se deteriorando com o aumento da urbanização. Os pescadores contam que, há 50 anos, era o rio que mais dava camarão. Hoje, há trechos dele em que não existe vida aquática alguma. Na maré alta, ele joga essa água podre no Caceribu.

SÃO GONÇALO DESPEJA ESGOTO
Segundo o plano de manejo da APA de Guapimirim, o Guaxindiba recebe esgoto doméstico e industrial, majoritariamente de São Gonçalo. A navegação pelo rio permite observar garrafas PET e outros resíduos sólidos nas margens, presos à vegetação de mangue que contorna o rio no trecho em que ele passa dentro da APA. Segundo o Ministério das Cidades, o índice de coleta de esgoto em São Gonçalo é de 55,5%, mas apenas 17,6% passam por tratamento.
De acordo com o Instituto Trata Brasil, ONG que pesquisa dados de saneamento, o município precisa de 133 mil novas ligações de esgoto para universalizar o serviço. Sem a rede completa, a consequência é um grande volume despejado "in natura" nos rios que cortam a cidade - o Guaxindiba é um deles - e, consequentemente, a chegada incessante de poluição à baía. O rio também recebe influência de Niterói, mas o município está em situação muito mais avançada em relação ao esgoto. Segundo o Ministério das Cidades, o índice de coleta é de 99,9%, enquanto o tratamento atinge 100% da rede.


Biólogo defende atuação do MP para ordenar preservação
Objetivo é que documento formal organize as ações na Baía de Guanabara

O biólogo Mario Moscatelli defende a assinatura de um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) entre o Ministério Público e a Secretaria estadual de Ambiente para ordenar as ações de preservação ambiental na Baía de Guanabara. Para isso, vai entregar à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) um documento reunindo fotos que retratam principalmente a degradação dos rios Guaxindiba e Estrela, em Duque de Caxias. O objetivo é que a OAB leve a iniciativa ao MP. "A celebração do TAC visa a ordenar e otimizar os projetos de recuperação da Baía de Guanabara", diz um trecho do documento.
Segundo o biólogo Maurício Muniz, o Rio Caceribu, apesar de ameaçado pela poluição, ainda é um dos cinco que chegam em boas condições à baía. Os outros são Suruí, Iriri, Guapi-Macacu e Guaraí - ao todo, 55 rios, córregos ou canais deságuam na baía. De acordo com o biólogo, a situação só não é pior porque o volume destes cinco rios corresponde a 60% da água doce que chega à baía:
- São os rios ainda vivos, porque não encontram grandes conglomerados urbanos no trajeto.
A Cedae, responsável pelo sistema de água e esgoto em São Gonçalo, disse que o governo do estado está investindo R$ 300 milhões no município. Sobre a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de São Gonçalo - reinaugurada em outubro do ano passado, 16 anos depois de ter sido aberta oficialmente, sem nunca ter funcionado -, a companhia afirmou que estão sendo tratados 300 litros de esgoto por segundo de forma primária.
O tratamento secundário, que na época da reinauguração havia sido prometido até o fim de 2014, ficou para o segundo semestre deste ano. Segundo a Cedae, o índice de tratamento na estação chegará a 600 litros de esgoto por segundo até o fim do ano.
A prefeitura de São Gonçalo informou que está elaborando o Plano Municipal de Saneamento. O município não respondeu se existem ações em andamento para frear o crescimento desordenado e para melhorar o sistema de coleta de lixo.
Outra aposta para aumentar os índices de coleta e tratamento no município é entregar parte das ações para a iniciativa privada. O governador Luiz Fernando Pezão já manifestou interesse em licitar, por meio de uma Parceria-Público-Privada (PPP), o serviço de saneamento em São Gonçalo. De acordo com a Secretaria estadual de Desenvolvimento Econômico, a proposta já foi incluída no programa que define as parcerias, mas os estudos que vão determinar o modelo exato nesse caso ainda não começaram. A previsão é que os trabalhos levem seis meses, e que os editais da licitação sejam lançados em seguida.

O Globo, 07/06/2015, Rio, p. 26

http://oglobo.globo.com/rio/esgoto-no-rio-guaxindiba-ameaca-area-de-protecao-ambiental-16371989
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