Os índios da aldeia Guarani de Cerro Corá, Terra Indígena Aguapeú - localizada dentro do Parque Estadual da Serra do Mar, em uma densa área de Mata Atlântica - garantiram acesso por via terrestre à cidade de Mongaguá (SP). Até agora os indígenas viviam quase que confinados, pois o proprietário da Fazenda Rondônia, por onde teriam que passar para chegar à cidade, não permitia a entrada deles em sua propriedade.
A Justiça Federal de primeira instância, acolhendo parcialmente o pedido da Fundação Nacional do Índio (Funai), havia decidido que o proprietário rural deveria "tolerar" a passagem da Funai ou de órgãos por ela expressamente autorizados, apenas quando fosse justificada a urgência relacionada à saúde dos índios da aldeia. A fundamentação da sentença para permitir apenas o acesso restrito foi de que houve "encravamento voluntário" quando os Guarani decidiram estabelecer a Aldeia Cerro Corá naquele local em 2006.
A Funai recorreu e, agora, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) assegurou passagem livre pela fazenda, não apenas aos índios, mas também aos funcionários de instituições que fazem atendimento à aldeia. Para tanto, será necessário o cadastramento prévio dos moradores da comunidade Cerro Corá.
Ao contestar a fundamentação adotada pela sentença, o procurador regional da República Robério Nunes dos Anjos Filho afirmou que a Constituição reconhece o direito de os índios "viverem e buscarem seu bem-estar conforme seus próprios padrões de necessidades básicas e suas respectivas escalas de valores, tomando as decisões que entenderem melhor nesse sentido". Trata-se do direito à autonomia assegurado na Constituição, ressaltou.
A reorganização do grupo Guarani da Terra Indígena do Agüapeú em outro núcleo, a Aldeia Cerro Corá, insere-se na tradição do "caminhar Guarani", em direção ao litoral. No estudo "Migrações históricas e cosmologia Guarani", a antropóloga Juracilda Veiga afirma que "não está na índole do Guarani ficar em um só lugar; é preciso andar para conhecer, para observar e para aprender".
A 2ª Turma do TRF3 considerou que o obstáculo ao acesso à educação e à saúde da comunidade indígena vizinha "é algo que não pode ser tolerado com a argumentação oposta do mero direito de propriedade". "Não se está a discutir a posse ou o uso da propriedade alheia, mas sim o mero direito de passagem, de transposição", afirmou.
Para o colegiado, liberar a passagem pela propriedade rural é "requisito mínimo para a dignidade humana dos integrantes da aldeia indígena em questão, sob pena de se conceber uma comunidade fadada ao confinamento, com crescente deterioração social por força do abandono e isolamento forçado".
Acesso à cidade - Além da via terrestre, que passa pela Fazenda Rondônia, a comunidade da Aldeia Cerro Corá pode sair da aldeia pela via fluvial. Porém, o percurso de sete quilômetros pelos rios Bichoró e Aguapeú é instável e está sujeito à navegabilidade, que varia de acordo com as estações do ano.
A viagem demora em média uma hora e 30 minutos e as dificuldades aumentam porque a aldeia conta com apenas dois barcos, um deles sem motor. E nem sempre há recurso para a compra de gasolina para o barco com motor.
Com isso, a entrega de mudas frutíferas, peixes e galinhas ficou inviável. O Secretaria de Educação do Município de Mongaguá também vem encontrando dificuldades de entregar a merenda escolar. O comércio de artesanato, que constitui uma das fontes de renda da aldeia, também foi prejudicado.
Processo 0009079-24.2008.4.03.6104/SP - Acórdão
Processo 0009079-24.2008.4.03.6104/SP - Acórdão
http://www.mpf.mp.br/regiao3/sala-de-imprensa/noticias-r3/indios-guarani-garantem-direito-de-passagem-em-fazenda-na-mata-atlantica
Índios:Direitos Indígenas
Unidades de Conservação relacionadas
- UC Serra do Mar (PES)
- TI Guarani do Aguapeú
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