Concessão de Vila Velha será modelo para parques estaduais do Paraná
Proposta prevê concessão de uso da área dos atrativos do parque de Ponta Grossa em troca de outorga
O governo do estado anunciou na semana passada o início de um novo processo de concessão do PEVV (Parque Estadual de Vila Velha), localizado em Ponta Grossa (Campos Gerais). O objetivo é delegar uma área pré-estabelecida para atividades de uso público e turismo à iniciativa privada, que ficará responsável por investir na estrutura de visitação e em setores como a segurança patrimonial - além de pagar uma outorga mensal ao estado. Em troca, poderá cobrar pela entrada, ingressos para atrativos, estacionamento e serviços como alimentação e loja de conveniência.
A política pública da UC (unidade de conservação) e a supervisão do plano de manejo continuarão sob responsabilidade do IAP (Instituto Ambiental do Paraná). Vencerá a licitação a empresa que oferecer a maior outorga. Documentos como os estudos técnicos e as minutas do contrato ficam disponíveis até o dia 20 de agosto.
64 PARQUES
Titular da Sedest (Secretaria de Desenvolvimento Sustentável e do Turismo) - que substituiu a pasta de Meio Ambiente e Recursos Hídrico -, Márcio Nunes diz que, em caso de sucesso da concessão do PEVV, a ideia é utilizar o modelo para conceder outros parques estaduais. Serão priorizados aqueles que já atraem visitantes e que não possuam pendências de regularização fundiária. "Temos 64 parques no Paraná. Se houver interesse da iniciativa privada, a intenção é conceder", disse Nunes.
Famoso pelos arenitos - formações rochosas que se assemelham a esculturas -, o Parque de Vila Velha foi escolhido por possuir áreas com potencial para atividades variadas. Entre as atividades propostas estão trilhas, campo de desafios, mountain bike, balonismo e glamping (espécie de acampamento de luxo que se tornou tendência no mercado de turismo). A facilidade de acesso e a proximidade com Curitiba e o estado de São Paulo são outros atributos, segundo o secretário. O parque recebeu 65.098 visitantes em 2018.
Atualmente, o ingresso para o passeio completo no parque (incluindo visitas às furnas, Lagoa Dourada e arenitos) sai por R$ 18 - mais o custo dos guias turísticos, obrigatórios desde 2017. Os novos preços serão definidos pela concessionária.
A extensão a ser concedida na licitação está limitada à porção de uso público, concentrada em uma área de 13,4% da unidade (424,88 hectares) - hoje, sob titularidade da Paraná Turismo. É onde se encontram os Arenitos, as Furnas e a Lagoa Dourada. O restante da unidade consiste em mais de 2,7 mil hectares de campos e matas.
Para Nunes, o modelo de concessão de uso de áreas determinadas, em que se transfere apenas a exploração dos principais atrativos à iniciativa privada, é "o que há de mais moderno" na gestão de parques naturais. O secretário avalia que, além de ganhos com o turismo, há benefícios para a preservação. "O princípio é ter desenvolvimento e geração de turismo e renda combinados com o cuidado ao meio ambiente. Não queremos ter ambientalistas de um lado e desenvolvimentistas do outro", diz. Segundo ele, o Paraná gasta em torno de R$ 4 milhões por ano com a manutenção do parque.
EXEMPLO DE IGUAÇU
Para Fernando Sousa, diretor institucional e de sustentabilidade do Grupos Cataratas - concessionária das Cataratas do Iguaçu -, a experiência no parque nacional em Foz é um exemplo de que não é preciso haver dicotomia entre preservação e orientação para o turismo. As Cataratas podem superar a marca de 2 milhões de visitantes neste ano. A concessão ocupa apenas cerca de 3% da área do parque. O restante está sob responsabilidade do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), que mantém uma relação próxima com a concessionária.
"É um modelo de gestão que beneficia o interesse público de uma forma geral", argumenta Sousa. "Quando o Estado delega certas atividades para a iniciativa privada, elas passam a ter maior qualidade, porque se busca eficiência de resultados. Em contrapartida, o governo passa a arrecadar ao invés de gastar."
Sousa diz que um estudo feito em parceria com a UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) apontou que o parque gera cerca de R$ 40 milhões por ano para a economia do entorno. Outro estudo, em âmbito nacional, sobre efeitos do turismo em UCs federais, feito pelo pesquisador Thiago Beraldo, do ICMBio, calculou que cada R$ 1 investido nos parques nacionais em 2017 gerou retorno de R$ 7 para economia.
O modelo do Parque do Iguaçu, segundo Sousa, seria uma boa referência para o aproveitamento dos parques estaduais do Paraná como alternativa de desenvolvimento econômico. O diretor avalia que, embora não tenham o mesmo nível de atratividade do Iguaçu, unidades como Vila Velha, Ilha do Mel e Pico do Marumbi são interessantes para empresas que buscam parques médios e com potencial de nicho. Ele alerta, contudo, que o sucesso das concessões depende de projetos consistentes, que ofereçam segurança e condições de inovação para as empresas.
EXAGEROS
Procurados pela FOLHA, pesquisadores da UEPG (Universidade Estadual de Ponta Grossa) que estudam o parque há anos lembraram que Vila Velha já foi alvo de exageros no passado - como a instalação de um kartódromo, antes da lei federal que embasou a elaboração de um plano de manejo para o parque, em 2000. Entre os impactos dos abusos está a extinção de uma população de peixes em uma das furnas, onde funcionava um elevador panorâmico.
Para Isonel Meneguzzo, professor do departamento de Geociências da universidade, a concessão pode ser benéfica para o aumento da visibilidade e da visitação do parque, além da inibição de crimes ambientais no local. "Mas tem de ser feita de forma a causar o mínimo possível de impactos ambientais", diz.
Do mesmo departamento, o geólogo Gilson Burigo Guimarães aponta que concessões dessa natureza podem ser positivas, mas alerta que o modelo precisa ser adaptado a cada local. Uma aplicação positiva como a que se deu no Parque Nacional do Iguaçu, por exemplo, dependeria de um fortalecimento do IAP, que hoje sofre com a falta de pessoal. As características de cada unidade também são determinantes para equilibrar o uso turístico e a preservação.
"O que é feito em Fernando de Noronha (PE) não pode ser transferido a Superagui ou à Ilha do Mel. O nível de fragilidade em cada uma é totalmente diferente", diz Guimarães. "Há locais que não são adequados para a presença em massa. Não podemos colocar em primeiro lugar apenas a questão de retorno econômico", defende.
O diretor de Biodiversidade e Áreas Protegidas do IAP, Aristides Athayde, reconhece a carência histórica do órgão, mas argumenta que as concessões de uso, que resultam na transferência das atividades turísticas à iniciativa privada, contribuem para que o governo se concentre mais na preservação. "O Estado vai ter como se preocupar com o que interessa de fato", diz.
LACUNAS
Os dois professores da UEPG, Isonel Meneguzzo e Gilson Burigo Guimarães, fizeram uma análise preliminar dos documentos apresentados pelo governo. Eles concordaram que a proposta é razoável em relação ao plano de manejo do parque. Ambos, contudo, apontaram lacunas que merecem atenção na discussão do projeto - que vai a audiência pública no dia 15, em Ponta Grossa.
Guimarães considera negativo que o Estado declare, na justificativa do projeto, não ter "recursos humanos e financeiros para prestar, de maneira eficiente, os serviços adequados de infraestrutura, atendimento aos programas de visitação e incentivo ao uso público, ações de manejo e conservação do Parque". Para ele, é uma questão de escolha política. O professor também diz que os textos não deixam claro que o principal objetivo do parque deve ser a preservação.
Outros itens que precisam de maior detalhamento são critérios para a definição de horários de visitação, que devem observar aspectos como a circulação da fauna do local, e possíveis impactos de atividades previstas no plano. "Mas acho que os atrativos propostos são, essencialmente, razoáveis", avalia.
Entre os itens que o professor considera positivos está a menção ao compromisso da concessão com o entorno. "É uma preocupação muito grande, por exemplo, para os guias turísticos do parque", conta. "Uma das principais críticas que há em Ponta Grossa é que Vila Velha é como se fosse uma ilha à parte, que as pessoas visitam sem interagir com o restante", explica.
Artoni expressou preocupação com o impacto que novas atividades poderão causar, mas disse não ver a iniciativa "com maus olhos" - desde que o IAP tenha condições de manter uma fiscalização rigorosa.
O biólogo diz que é importante que o projeto inclua a presença de um representante da comunidade científica no acompanhamento da concessão - o que não ocorre na proposta inicial. "A ciência precisa ser o fiel da balança, e o governo deve desempenhar sua função de fiscalização", defende. "É um patrimônio paranaense, brasileiro e mundial. Nossa responsabilidade sobre ele é muito grande", diz.
https://www.folhadelondrina.com.br/geral/concessao-de-vila-velha-sera-modelo-para-parques-estaduais-do-parana-2956898e.html
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