Concessão do Iguaçu e outros parques pode ser um desastre sem fiscalização forte

Rede Brasil Atual - https://www.redebrasilatual.com.br - 09/12/2019
Concessão do Iguaçu e outros parques pode ser um desastre sem fiscalização forte
Proposta do governo Bolsonaro para os parques nacionais Iguaçu, Lençóis Maranhenses e Jericoacoara preocupa em cenário de desmonte do Ibama e do ICMBio

por Rodrigo Gomes, da RBA

São Paulo - A possibilidade de concessão dos parques nacionais dos Lençóis Maranhenses, no Maranhão, e de Jericoacoara, no Ceará, além da renovação da concessão do Iguaçu, no Paraná, preocupa especialistas em preservação ambiental por conta do desmonte da fiscalização promovida pelo governo do presidente Jair Bolsonaro desde o início de seu mandato. "Para um bom projeto de concessão funcionar precisa ter uma fiscalização forte, uma autarquia, no caso o ICMBio, forte, com a capacidade técnica que ela já tem para implementar e acompanhar esse processo", explica a gerente de Áreas Protegidas da Fundação SOS Mata Atlântica, Érika Guimarães.

O Instituto Chico Mendes de Bioconservação (ICMBio) é responsável pela gestão das unidades de conservação nacionais. Mas, junto com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), sofreu cortes de recursos, críticas públicas, suspensão de fiscalizações e até ameaças do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, de investigar e punir agentes que combatem crimes ambientais e desmatamento. Em abril, o então presidente do ICMBio Adalberto Eberhard pediu demissão. Em seguida, a diretoria técnica do instituto foi trocada por oficiais da Polícia Militar de São Paulo.

A especialista em biodiversidade e assessora do Instituto Socioambiental (ISA) Nurit Bensusan, também considera a fiscalização como fundamental para evitar que a conservação das áreas como a das cataratas do Iguaçu fique em segundo plano, permitindo uma exploração incompatível com a preservação ambiental. Mas teme que o desmonte atual impeça a atuação dos agentes.

Desmonte proposital?
"Os órgãos ambientais nunca tiveram muito dinheiro, sempre tiveram carência de pessoal. O que aconteceu nesse ano é indescritível. Teve desmonte aparentemente de propósito desses órgãos. Aquela fiscalização, que era incipiente, mas acontecia, nem ela mais acontece", relata Nurit. "Tem uma narrativa que é muito contrária à conservação das florestas, da biodiversidade, da natureza em geral, hoje no Brasil. Junta as duas coisas. O desmonte, a incapacidade desses de fiscalização, com essa narrativa de que preservar a natureza não é importante, pode ter um resultado bastante desastroso", pondera.

As duas especialistas não são, no entanto, contrárias à concessão dos serviços relacionados à visitação dos parques. Elas consideram que a administração das visitas, guias, estacionamento, restaurantes, pousadas podem ser feitas pela iniciativa privada, como já ocorre no Parque Nacional no Iguaçu. Mas é preciso que se garanta algumas regras, para evitar que a capacidade de visitação seja expandida demais. E que construções, passeios ou atividades prejudiquem a conservação da biodiversidade, entre outros.

"Pode conceder serviços de visitação, mas só eles. Não a gestão da unidade. Precisa que fique muito claro que os serviços que forem terceirizados estão subordinados aos serviços de conservação dessas áreas protegidas. Claro que a visitação é muito importante, mas o fundamento dos parques nacionais é conservar a biodiversidade", defende a assessora do Instituto Socioambiental.

Érika destaca ainda que, mesmo sendo rentáveis - só o Iguaçu recebe 2 milhões de visitantes por ano -, os parques nacionais não têm condições de se manter sozinhos e melhorar os serviços para visitantes, porque parte da verba arrecadada com a bilheteria volta para o governo federal. "E a gente tem a Lei do Teto de Gastos (que impede o aumento das despesas acima da inflação). Ainda que as unidades fossem super rentáveis e arrecadassem uma fortuna, esse dinheiro dificilmente voltaria para a implementação das unidades de conservação."

Comunidades locais
Outra preocupação apontada por Nurit é com as comunidades locais. Em muitos lugares, a população do entorno "assumiu" os serviços de visitação, guias turísticos, alimentação, camping, transporte. E agora podem ficar sem sua fonte de renda, com a concessão do serviço a uma grande empresa. Até o ano passado, o ICMBio vinha construindo propostas para os concessionários se comprometerem a contratar mão de obra local ou comprar produtos locais. Ela defende um processo concomitante de capacitação da comunidade na gestão dos serviços de concessão para que, no futuro, elas possam concorrer na licitação.

"Quando você terceiriza e faz esse processo de concessão por editais, as comunidades locais não têm a menor condição de participar. E perdem suas condições de subsistência, que existiam no vácuo da presença do Estado ou de uma concessão", explica."Claro que ter serviços de visitação precários não é o cenário ideal, mas alijar essas comunidades de uma forma súbita também não é boa ideia. A gente precisa que essas comunidades locais sejam aliadas no processo de conservação. Não se vai preservar nenhuma biodiversidade se você não tiver a aliança dos que vivem no seu entorno", argumentou Nurit.

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