Águas protegidas

CB, Cidades, p. 2 - 03/08/2007
Águas protegidas
Ministério Público Federal quer garantir a preservação da Bacia do Descoberto, no processo de ordenamento territorial de Águas Lindas (GO). Manancial responde por 70% do abastecimento do DF

Morillo Carvalho
Da equipe do Correio

A principal fonte de abastecimento de água da capital deve ser protegida. O Ministério Público Federal no Distrito Federal (MPF/DF) determinou que as autoridades de Águas Lindas (GO), distante 47km de Brasília, planejem o crescimento urbano do município de forma a não deteriorar a Área de Proteção Ambiental (APA) da Bacia do Rio Descoberto. A APA responde por 70% da água potável que chega aos lares brasilienses.

A cidade goiana é o sexto município que mais cresce no país, segundo o último censo demográfico realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Nos últimos 15 anos, a população de Águas Lindas saltou de 20 mil para cerca de 167 mil habitantes (um aumento de 20,3% ao ano). A infra-estrutura do lugar é precária: cerca 70% das casas da não têm água tratada e 90% das ruas são de terra batida. Ao lado de Luziânia e Valparaíso, ambos em Goiás, Águas Lindas está entre as cidades brasileiras com maior número de assassinatos, tentativas de homicídio e estupros. O crescimento desordenado da região ameaça a qualidade de vida e o meio ambiente do Entorno e DF.

O novo Plano Diretor de Ordenamento Territorial (Pdot) de Águas Lindas é discutido por um grupo de 30 pessoas, entre representantes da sociedade civil e do governo local. Segundo a recomendação do MPF, o grupo deve criar regras de proteção à APA do Descoberto. E a prefeitura municipal tem 10 dias para revelar ao Ministério Público como fará isso. Se o prazo estipulado não for cumprido, os representantes do MPF encaminharão o caso à Justiça Federal, que deverá tomar as providências que considerar cabíveis contra a degradação ambiental: o que inclui multas e outras sanções.

A procuradora-adjunta de Águas Lindas, Patrícia Nogueira de Andrade, garante que o novo plano diretor respeitará o zoneamento, mas ficará pronto apenas no final do ano. "Já promovemos audiências públicas e contratamos, por licitação, uma equipe técnica para fazer o mapeamento da cidade. A área vai ser respeitada", assegura.

Sinais de alerta
Um primeiro alerta de que é preciso proteger as margens do Descoberto soou no final de novembro de 2004, quando 428 dos 751 lotes do Residencial Bela Vista foram colocados à venda. O empreendimento com mais de 20 hectares começava às margens da BR-070, na entrada do município, sentido Brasília-Águas Lindas. Em pouco mais de um mês, 150 lotes foram comercializados e o caso foi parar da Justiça. As construções ameaçavam contaminar as águas do Descoberto e provocar novos assoreamento (depósito de terra nas águas, que diminui o tamanho dos rios, podendo até secá-los). De lá para cá, mais problemas, como o uso das águas para diversão de milhares de pessoas às margens da BR-070, poluindo o rio e destruindo as matas de galeria, e a atividade agrícola desordenada, próxima das águas.

A medida do MPF é antecipatória, ou seja, uma forma de evitar que irregularidades sejam cometidas após a aprovação do plano diretor. Embora garanta que o Pdot de Águas Lindas respeitará a área protegida, Patrícia disse que ainda não houve tempo para discutir o que será feito, já que a recomendação chegou há três dias ao município. "Vamos reunir o grupo de trabalho que discute o Pdot com representantes do governo para definir o que será feito", explicou a procuradora.

Em Águas Lindas, a entidade que emite licença ambiental é a Agência Ambiental do Goiás, que também foi notificada pelo MPF. Mas, como a APA abastece o DF, qualquer plano de urbanização na cidade deve ter redes de coleta e esgoto construídas conforme os padrões da Companhia de Saneamento Ambiental de Brasília (Caesb) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Ou seja, antes de emitir licenças, a Agência Ambiental de Goiás deve consultar o Ibama e a Caesb.

"Águas Lindas teve um crescimento populacional expressivo nesta década e no fim da década passada. Foi inevitável que a região protegida tivesse parte ocupada. Não tivemos problemas com esgoto nas águas, mas parte dos rios foram assoreadas", detalhou o gestor do consórcio Águas Lindas na Caesb, Mércio Viana. Para o chefe da APA do Descoberto no Ibama, Lídio José dos Santos, a recomendação do Ministério Público Federal é sensata. "É uma exigência legal pedida há muito tempo pela Caesb e pelo Ibama, e que vem ao encontro à melhor forma de preservar a APA do Descoberto", avaliou.
Colaborou Edma Cristina de Góis


Para saber mais
Importante para Brasília

A Bacia do Descoberto garante o abastecimento de água de 70% da população da capital federal. Ela é formada pelo Rio Descoberto, que nasce no Distrito Federal, e os ribeirões Rodeador, das Pedras, Melchior e Engenho das Lajes. A falta de sistema de canalização da água das chuvas e de impermeabilização do solo, a partir da construção de loteamentos em Águas Lindas, deteriora a vegetação que deveria proteger o manancial. A atividade agrícola sem planejamento também tem impactos negativos sobre a Bacia do Descoberto. A área urbana é a que mais causa problemas de degradação hídrica. O crescimento de Águas Lindas faz com que as águas deixem de escorrer superficialmente e ganhem maior vazão ao longo do percurso do rio, formando voçorocas (erosões) no solo. Além da Bacia do Descoberto, a de Santa Maria também garante o abastecimento da capital federal - juntas, elas fornecem 90% da água potável consumida no DF. Cerca de 710 mil pessoas dependem dos recursos hídricos vindos da Bacia do Descoberto.

Cidades, 03/08/2007, Cidades, p. 25
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