O Globo, Sociedade, p. 27 - 08/04/2016
Natureza em risco
Metade dos patrimônios mundiais está ameaçada por atividades econômicas, diz WWF
RENATO GRANDELLE
renato.grandelle@oglobo.com.br
De Machu Picchu às Cordilheiras do Himalaia, passando por Pantanal e Atol das Rocas, há 114 Patrimônios Mundiais Naturais ameaçados no planeta. O número, apresentado em um novo relatório do WWF, corresponde a quase metade das 229 localidades eleitas pela Unesco como as de paisagem mais preciosa e de conservação prioritária. No Brasil, seis das sete riquezas estão na chamada lista vermelha: as ilhas atlânticas (Fernando de Noronha e Atol das Rocas), a Chapada dos Veadeiros (Goiás), a Costa do Descobrimento (Bahia), as reservas do Sudeste da Mata Atlântica, o Pantanal e o Parque Nacional do Iguaçu. Apenas o complexo da Amazônia Central não registra intervenções danosas em seu ecossistema.
Entre os principais riscos enumerados pelo relatório estão a extração de petróleo, a mineração, a pesca predatória e o desmatamento. Onze milhões de pessoas dependem dessas áreas para subsistência e sofrem o impacto das atividades econômicas e 90% dos sítios podem gerar emprego e benefícios para a população ao redor. Esta receita contribuiria para os países cumprirem a Agenda de Desenvolvimento Sustentável 2030, uma lista de 17 ações que devem ser tomadas nos próximos 15 anos para reduzir a pobreza no planeta.
- Estes são alguns dos locais mais valiosos e excepcionais do planeta. - destaca Marco Lambertini, diretor-geral do WWF e autor do relatório "Proteger as pessoas através da natureza". - E devem continuar proporcionando bemestar à população. 20% SOFREM COM MAIS DE UMA OPERAÇÃO Aproximadamente 20% dos patrimônios naturais sofrem com mais de uma atividade industrial. Na Costa do Descobrimento, por exemplo, há registros de exploração de petróleo, mineração e construção de rodovias. Para evitar estas ações, Lambertini recomenda que o poder público negue financiamento a projetos de companhias dentro das áreas protegidas.
Mario Barroso, superintendente de Conservação do WWF-Brasil, alerta que o panorama de outras unidades de conservação sem o mesmo status de proteção pode ser ainda pior.
- Mesmo o reconhecimento mundial de uma área não a torna isenta de ameaças. Então, imagine os problemas de regiões que não têm este título? - questiona. - No Brasil, só há mais esforços se uma área tiver visibilidade. O Parque do Iguaçu, mesmo ameaçado, tem mais apelo porque é uma região turística. A Chapada dos Veadeiros, por sua vez, é isolada e por isso não atrai investimentos e fica vulnerável a atividades como a mineração.
Além dos benefícios proporcionados pelo ecoturismo, os patrimônios naturais captam gases de efeito estufa da atmosfera - atenuando os efeitos do aquecimento global -, servem como lar para espécies ameaçadas e protegem a cabeceira de rios que têm diversas utilidades, como o uso para a agricultura e o consumo humano.
Segundo Bernardo Baeta Neves Strassburg, diretor-executivo do Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS), o levantamento aponta que os esforços para conservação dos patrimônios naturais são "insuficientes" e "decepcionantes".
- O maior desafio da sustentabilidade é ensinar as pessoas a pensarem a longo prazo - explica Strassburg, que também é professor do Departamento de Geografia da PUC-Rio. - Infelizmente os projetos ambientais mudam a cada governo, e o mercado não paga a quantidade correta de impostos para explorar os recursos naturais. Isso mostra como o meio ambiente não é encarado como parte de nosso patrimônio estratégico.
O Globo, 08/04/2016, Sociedade, p. 27
http://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/metade-dos-patrimonios-mundiais-esta-ameacada-por-atividades-economicas-19041284
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